domingo, 22 de novembro de 2009

Prescrição e Decadência Tributária

O professor Agnelo Amorin Filho, em texto publicado na RT 300,(1) elaborou, através da abordagem científica, critérios que determinam a diferença entre prescrição e decadência, mudando de forma significativa o entendimento sobre estes institutos.

Segundo o emérito Professor:

"o critério mais divulgado para se fazer a distinção entre os dois institutos é aquele segundo o qual a prescrição extingue a ação, e a decadência extingue o direito. Entretanto, tal critério, além de carecer de base científica, é absolutamente falho e inadequado, uma vez que pretende fazer a distinção pelos efeitos ou conseqüências.
(...)
Segundo CHIOVENDA (Instituições, 1/35 e segs.), os direitos subjetivos se dividem em duas grandes categorias:

A primeira compreende aqueles direitos que têm por finalidade um bem da vida a conseguir-se mediante uma prestação, positiva ou negativa, de outrem, isto é, do sujeito passivo. Recebem eles, de CHIOVENDA, a denominação de "direitos a uma prestação", e como exemplos poderíamos citar todos aqueles que compõem as duas numerosas classes dos direitos reais e pessoais.

Nessas duas classes há sempre um sujeito passivo obrigado a uma prestação, seja positiva (dar ou fazer), como nos direitos de crédito, seja negativa (abster-se), como nos direitos de propriedade.

A segunda grande categoria é a dos denominados "direitos potestativos", e compreende aqueles poderes que a lei confere a determinadas pessoas de influírem, com uma declaração de vontade, sobre situações jurídicas de outras, sem o concurso da vontade dessas."

Para o professor, todas as vezes que se tem uma pretensão condenatória, sua ação estará sujeita à prescrição.

Por outro lado, se a pretensão é constitutiva, negativa ou positiva, a ação correspondente se sujeita a decadência

Assim, na Prescrição temos a suposição de um direito que ainda não pode ser exercido, para seu exercício se faz mister à propositura da ação. Uma vez não exercido esse direito, ou seja, não cobrado esse direito judicialmente, opera-se a prescrição. Daí comumente atrelar a prescrição a axioma: "a perda do direito de ação".

Na decadência a ação e o direito nascem concomitantemente, portanto ocorrendo a decadência, extinto está o direito potestativo e seu pleno exercício.

A doutrina moderna estabelece que os dois institutos, em verdade atingem a esfera da pretensão.

Por sua vez, na seara tributária, a diferença cinge-se ao lançamento, a constituição do crédito tributário. Uma vez constituído o crédito tributário, não há que se falar em decadência, mas ainda pode-se aduzir a prescrição.

O artigo 173 do Código Tributário Nacional assim dispõe:

O direito da Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:
I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado.
(...) (...)
Parágrafo Único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.

Por sua vez, o artigo 174 do Código Tributário Nacional, assim dispõe:

Art. 174. A ação para cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data de sua constituição definitiva.

A decadência ou prescrição no âmbito tributário, prima facie, está associada ao comportamento da autoridade tributante, da autoridade administrativa lançar o crédito tributário tempestivamente, (art.173 do CTN) ou mesmo de executá-lo judicialmente (174 do CTN).

Pune-se a inércia, o comportamento omissivo da autoridade administrativa. Tal se deve, além da previsão legal, em razão do princípio da segurança jurídica.

Um comportamento omissivo da autoridade não tem o condão de renovar a possibilidade de cobrar os créditos tributários ad eternum.

Por outro lado, o direito também não acolhe o comportamento omissivo do contribuinte, uma vez que recolhendo tributo seja este indevido, a maior, mediante erro da autoridade, cálculo, não promova a medida cabível no tempo devido, seja a restituição do tributo pago a maior no prazo de 5 (cinco) anos, nos termos do art. 168 do CTN. (2)

Como se vê, o lapso temporal, o momento de sua ocorrência está adstrito à constituição do crédito tributário, bem como à possibilidade de sua exigência, o que nos leva a discorrer brevemente sobre o lançamento do crédito tributário.

Do Lançamento

Consoante art. 142 do CTN o crédito tributário é constituído pelo lançamento, senão vejamos:

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional'.

Da leitura do artigo acima, depreende-se que o lançamento é uma atividade do agente público. É um ato administrativo vinculado, um poder-dever da autoridade administrativa, para o qual não cabe a discricionariedade sob pena de responsabilização.

Muito embora seja um ato típico da administração pública, cabe exceção, qual seja com a figura do lançamento por homologação também chamado de "autolançamento".

Nos termos do art. 147 do CTN vê-se a exceção acima mencionada, a possibilidade de tanto a administração pública quanto o contribuinte realizarem o lançamento. Isto porque o contribuinte provocará a autoridade fiscal mediante apresentação de sua declaração.

Assim, após o recebimento da declaração do contribuinte pelo Fisco, e com base nela efetuará o cálculo do valor devido a título de imposto.

Insta notar que o lançamento não se limita a declarar a existência da obrigação tributária, ele também confere a esta liquidez e certeza à referida, possibilitando sua cobrança.

Consoante Ruy Barbosa Nogueira, a notificação do contribuinte "é o último ato do procedimento de constituição formal do crédito tributário que o torna oponível ao contribuinte." (3)

Para o Professor Paulo de Barros Carvalho, na verdade temos 3 modalidades de procedimento e não de lançamento. (4)

A doutrina classifica as modalidades de lançamento em três:
- lançamento de ofício (art. 149 do CTN)
- lançamento por declaração (art. 147 do CTN)
- lançamento por homologação (art. 150 do CTN)

Lançamento de Ofício

No lançamento de ofício o contribuinte não participa do ato, em geral esse tipo de lançamento é efetuado diante da omissão do contribuinte em prestar a declaração na forma e prazos estipulados pela legislação, dentre outras hipóteses, previstas no art. 149 do CTN.(5)

Se o contribuinte não apresentou a declaração no devido tempo, a autoridade administrativa efetuará o lançamento de Ofício.

Se a autoridade fiscal não lançar o tributo, no tempo oportuno estará sujeita à decadência. Por sua vez, se efetuado o lançamento, e notificado o contribuinte o lançamento se torna eficaz, sendo incabível a argüição de decadência.

Como expresso no parágrafo único, a revisão do lançamento de ofício somente caberá se não estiver extinto o direito da Fazenda Pública, enquanto não decaído o crédito tributário.

Notificado o contribuinte, inicia-se com este o prazo prescricional previsto no art. 174 do CTN, para a cobrança do crédito tributário.

Lançamento por Declaração

O lançamento por declaração(6), como denuncia o nome, é feito mediante declaração prestada pelo contribuinte ou por terceiro responsável, sem que haja a obrigação de pagamento antecipado. De posse das informações prestadas pelo contribuinte a administração: verificará a ocorrência do fato gerador, identificará o sujeito passivo, aferirá o valor do imposto a pagar, formalizando o crédito, e por fim notificará o contribuinte para o pagamento.

Nesta registra-se todos os dados exigidos de acordo com a lei do tributo, relevantes para a autoridade administrativa efetuar o ato de lançamento. Omissões ou fraudes impedem a autoridade administrativa de aferir corretamente os valores devidos bem como efetivar o lançamento, importando em fiscalização e lançamento por arbitramento.

O contribuinte poderá retificar suas declarações, (art. 147, parágrafo único 1º do CTN) e deverá fazê-lo até a notificação, sob pena de ter que mover a revisão por outros meios.

Não será admitida qualquer retificação, se esta objetivar reduzir ou excluir o tributo, somente será admissível se comprovado ERRO DE FATO e antes da notificação do lançamento.

Consoante o Professor Paulo de Barros Carvalho, "o erro do lançamento, entretanto, pode ser de direito. Quer os elementos do fato jurídico tributário, no antecedente, quer nos elementos da relação obrigacional, no conseqüente, quer em ambos, podem perfeitamente, estar em desalinho com os enunciados da hipótese ou da conseqüência da regra-matriz do tributo, acrescendo-se, naturalmente, a possibilidade de inadequação com outras normas gerais e abstratas, que não a regra padrão de incidência."(7)

E exemplifica o professor: "A autoridade administrativa, ao invés de exigir o ITR do proprietário do imóvel rural, entende que o sujeito passivo pode ser o arrendatário."

Lançamento por Homologação

No lançamento por homologação,(8) por força de lei, o contribuinte deverá verificar a ocorrência do fato gerador e efetuar o pagamento. À administração caberá a conferência e sua homologação.

O lançamento por homologação engloba a maioria dos tributos, e há uma delegação imprópria da atividade prevista no art. 142, inerente à autoridade administrativa fiscal ao contribuinte. Imprópria, pois como anteriormente explicitado o lançamento constitui ato administrativo vinculado, nos termos do artigo 142 , § Ú do CTN.

No lançamento por homologação o prazo decadencial (5 anos) conta-se da ocorrência do fato gerador nos termos do art. 150, §4º do CTN.

Depreende-se, portanto, que com a efetividade do lançamento e a notificação do contribuinte se inicia o prazo prescricional para a Fazenda Pública efetuar a sua cobrança, que é qüinqüenal.

Decadência

Consoante esclarece o Ministro Humberto Martins: "no direito tributário, o Código Tributário Nacional diferenciou decadência e prescrição, tratando da primeira no art. 173 e da segunda no art. 174. A concepção dominante é de que existe a decadência do direito de lançar, ou seja, de constituir o crédito tributário, nos prazos estabelecidos no primeiro dispositivo acima, enquanto a prescrição relaciona-se, posteriormente, com o exercício da ação dê cobrança pelo Fisco do crédito tributário já devidamente constituído."(9)

Em tese, o prazo decadencial, se inicia no primeiro dia do exercício financeiro seguinte àquele em que o tributo poderia ter sido lançado. Cabem as ressalvas aos tributos submetidos ao lançamento por homologação, se houve antes da notificação do sujeito passivo, medida preparatória indispensável ao lançamento, o início do prazo decadencial é antecipado para a data dessa notificação. A notificação feita depois de iniciado o prazo decadencial não o interrompe nem o suspende.

No que tange a decadência, seu prazo inicial conta-se, nos termos do art. 150, § 4º, para os casos sujeitos ao lançamento por homologação da ocorrência do fato gerador.

Para os demais tipos de lançamento, inicia-se do primeiro dia do exercício seguinte à aquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos termos do art. 173, I do CTN.

Se o lançamento foi anulado por vício formal, contar-se-á da data em que se tornar definitiva a decisão anulatória, nos termos do art. 173, II do CTN.

Por sua vez, se houve a notificação de medida preparatória do lançamento, antes de iniciado o curso da decadência, contar-se-á da data da notificação, nos termos do art. 173, Parágrafo Único do CTN.

Da Prescrição

Como já exposto, constituído definitivamente o crédito tributário, mediante lançamento, com a notificação do contribuinte inicia-se o prazo prescricional.

O termo inicial é o primeiro dia do exercício seguinte em que o lançamento poderia ter sido efetuado

Por sua vez, a questão não é pacífica, uma vez que temos as seguintes divergências teóricas quanto ao momento da constituição do crédito, no que tange ao seu marco inicial, vejamos:
1ª - Da notificação do sujeito passivo para pagar o impugnar o lançamento;
2ª - Da decisão de primeira instância administrativa;
3ª - Da decisão de segunda instância administrativa;
4ª -Da decisão definitiva na esfera administrativa
5ª - Da inscrição na Dívida Ativa.

Consoante o Professor Kiyoshi Harada, a decisão administrativa não tem o condão de constituir o crédito, posto que já estava constituído nos termos dos artigos 142 e 145 do CTN(10), ora transcrito :

"Esta fase administrativa de solução da lide nada tem a ver com o procedimento administrativo do lançamento em que não se cogita de aplicação do princípio contraditório e ampla defesa, por se tratar de direito potestativo da Fazenda de constituir o crédito tributário.

Há um equivoco na tese sustentada por parte da doutrina e da jurisprudência no sentido de que o crédito tributário só se constitui definitivamente com a decisão irreformável na esfera administrativa, porque o recurso administrativo poderá resultar em modificação do lançamento.

Ora, a decisão administrativa não tem o condão de constituir o crédito que já estava constituído nos termos dos artigos 142 e 145 do CTN. Essa decisão tem o condão apenas de desconstituir o crédito tributário extinguindo-o (art. 156, IX do CTN) caso o lançamento tenha incorrido em alguma irregularidade formal ou material."

Assim, o prazo prescricional deverá será contado a partir do dia em que a ação de exigência do tributo pode ser praticada.

Uma vez efetuada a notificação e o tributo não tiver sido impugnado na fase administrativa, o contribuinte terá prazo de 30 (trinta) dias para efetuar seu pagamento.

Não o fazendo, o crédito torna-se exigível, momento incidirá o dies a quo do prazo prescricional.

Não há, contudo que se falar em transcurso de prazo prescricional, nesse interregno, posto que o contribuinte poderá recolher o tributo, inexistindo, portanto interesse processual à Fazenda para ajuizar a execução fiscal.

A dificuldade está na verificação do termo inicial - dies a quo.

O Ministro Luis Fux em voto de sua lavra elucida a questão declinando expressamente em Agravo Regimental no Ag. 898911/PR que :

3. Deveras, assim como ocorre com a decadência do direito de constituir o crédito tributário, a prescrição do direito de cobrança judicial pelo Fisco encontra-se disciplinada em cinco regras jurídicas gerais e abstratas, a saber:
(a) regra da prescrição do direito do Fisco nas hipóteses em que a constituição do crédito se dá mediante ato de formalização praticado pelo contribuinte (tributos sujeitos a lançamento por homologação);
(b) regra da prescrição do direito do Fisco com constituição do crédito pelo contribuinte e com suspensão da exigibilidade;
(c) regra da prescrição do direito do Fisco com lançamento tributário ex officio;
(d) regra da prescrição do direito do Fisco com lançamento e com suspensão da exigibilidade; e
(e) regra de reinício do prazo de prescrição do direito do Fisco decorrente de causas interruptivas do prazo prescricional." (1) (instituídas pela LC 118/05)

E conclui: Consoante cediço, as aludidas regras prescricionais revelam prazo qüinqüenal com dies a quo diversos.

O dies a quo para os tributos declarados pelo contribuinte, mediante DCTF, GIA, tributos sujeitos à homologação, em que não houve o pagamento antecipado, se dará na data do vencimento para o pagamento da obrigação. (desde que não haja qualquer causa suspensiva de sua exigibilidade).

Se o Fisco constitui o crédito tributário, mediante lançamento, inexistindo quaisquer causas de suspensão da exigibilidade ou de interrupção da prescrição, o prazo prescricional conta-se da data da notificação do contribuinte, do lançamento tributário, nos termos dos artigos 145 e 174 do CTN.

Se, por outro lado sobrevier causa de suspensão de exigibilidade, antes do vencimento do prazo para pagamento do crédito tributário (lançamento por homologação), se não reiniciado o prazo nos termos do Parágrafo Único do art. 174, será o reinício se dará a partir da data do desaparecimento da suspensão da exigibilidade.

Havendo causa interruptiva da prescrição, ou mesmo de reinicio da contagem do prazo, também deverá ser contado o novo prazo prescricional do momento em que o Fisco deveria exigir o tributo e não o fez.

Assim, contar-se-á com o vencimento do crédito tributário, regularmente constituído por declaração formal do contribuinte, pelo lançamento ou após julgamento de recurso administrativo. Nesse sentido as decisões: REsp nº 673.585/PR, Rel. Minª Eliana Calmon, REsp nº 671.219/RS, Rel.Min. Teori Albino Zavascki; REsp nº 671043/PR, Rel. Minª Denise Arruda do STJ.

A prescrição na seara tributária, ainda gera uma gama imensa de dúvidas, seja por ser tratada como forma de extinção do crédito tributário, seja em razão de sua suspensão ou interrupção, ou mesmo diante da suspensão da exigibilidade do tributo enquanto pendente de julgamento na fase administrativa.

Dentre elas, há a divergência quanto ao prazo do reconhecimento da prescrição intercorrente na execução fiscal, após as edições das Leis 11.051/2004 e Complementar 118/05.

Da Prescrição Intercorrente

A prescrição intercorrente por seu turno, ocorre no curso da Execução Fiscal, tendo-se em vista a inércia da Fazenda Pública em localizar o contribuinte e promover o devido andamento do feito.

Uma vez suspenso o processo executivo fiscal pelo art. 40 da LEF, por um ano, reiniciava-se o prazo prescricional de 5 anos, isto, antes da edição da Lei Complementar 118/05.

A Lei Complementar nº 118/05 promoveu uma série de alterações no CTN, objetivando a sua adaptabilidade à nova Lei de Falências (Lei nº 11.101/05).

Dentre as mudanças fundamentais instituídas pela referida Lei, temos a modificação da redação do artigo 174, Parágrafo Único, inciso I, do CTN, estabelecendo a causa interruptiva do prazo prescricional para a propositura de ação de cobrança do crédito tributário.

Isso foi feito, declinando o prazo prescricional será interrompido pelo despacho do Juiz que determinar a citação do devedor, dentro do prazo de 5 (cinco) anos, está interrompido o prazo prescricional.

A Ministra Eliana Calmon do Superior Tribunal de Justiça, em relatório e voto proferido em sede REsp 1034191 (2008/0041920-0 - 26/05/2008) assim se manifestou:

"Sobre a prescrição intercorrente, a jurisprudência do STJ sempre foi no sentido de que, em execução fiscal, o despacho que ordenar a citação não interrompe a prescrição, uma vez que somente a citação pessoal tem esse efeito, devendo prevalecer o disposto no artigo 174 do CTN sobre o artigo 8º, § 2º, da Lei n. 6.830/80.

Conseqüentemente, somente a citação regular interrompe a prescrição, mas esta, quando tratar de direitos patrimoniais, não pode ser decretada de ofício.

Ocorre que, com o advento da Lei n. 11.051, de 29.12.2004, que acrescentou o §4º ao art. 40 da Lei n. 6.830/80, tornou-se possível à decretação ex officio da prescrição pelo juiz, mas somente nos casos de prescrição intercorrente, após ouvido o representante da Fazenda Pública, consoante o texto da Lei n. 11.051/2004 abaixo trasladado, in verbis:

"Art. 6o - O art. 40 da Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980, passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 40 (...)
§ 4o Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato."

Registre-se, ainda, que, com o advento da Lei n. 11.280, de 16.2.2006, com vigência a partir de 17.5.2006, o art. 219, § 5º, do CPC passou a viger com a seguinte redação: "O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição ."

Cumpre, antes de tudo, entender que a prescrição intercorrente, consoante aplicação, é resultante de construção doutrinária e jurisprudencial para punir a negligência do titular de direito e também para prestigiar o princípio da segurança jurídica, que não se coaduna com a eternização de pendências administrativas ou judiciais. Assim, quando determinado processo administrativo ou judicial fica paralisado por um tempo longo, por desídia da Fazenda Pública, embora interrompido ou suspenso o prazo prescricional, este começa a fluir novamente. Portanto, a prescrição intercorrente pressupõe a preexistência de processo administrativo ou judicial, cujo prazo prescricional havia sido interrompido pela citação ou pelo despacho que ordenar a citação, conforme inciso I, do parágrafo único do art. 174 do CTN, com a redação que lhe foi dada pela Lei Complementar nº 118, de 9-2-2005. Portanto, a prescrição intercorrente é aquela que diz respeito ao reinício da contagem do prazo extintivo após ter sido interrompido." (grifos nossos)

Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, o processo será suspenso por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente. (Súmula 314 do STJ)(12) Insta observar, contudo que a aplicação da Lei Complementar 118/05, não é retroativa.

A disparidade verifica-se no processo administrativo, uma vez que neste não há que aduzir a prescrição intercorrente, consoante entendimento uníssono do STJ, para quem a exigibilidade do crédito encontra-se suspensa - art. 151, III do CTN(13).

Estando suspensa a exigibilidade do crédito tributário, não há que se aduzir a sua prescrição, posição essa que muitos contribuintes contestam diante da morosidade dos processos administrativos fiscais, e diante da ordem pública da natureza da norma instituidora da prescrição e decadência.

Notas

(1) RT 300, outubro de 1960 - pág. 7

(2) Art. 168 - O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:

(3) Nogueira, Ruy Barbosa - Curso de Direito Tributário. Ed. Saraiva, 1995.

(4) Carvalho, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, 8ª edição - Saraiva.

(5) Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:
I - quando a lei assim o determine;
II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;
III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;
IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;
V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;
VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;
VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;
VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;
IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.
Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.

(6) Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.
§ 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.
§ 2º Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela

(7) Carvalho, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 18 edição. Editora Saraiva. Pág. 433.

(8) Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.
§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.
§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação

(9) BDJUR - revista do Superior Tribunal de Justiça - fonte: site do STJ

(10) Revista Jus navegandi - http://jus2.uol.com.br/doutrina

(11) Referência expressa no acórdão - In: Decadência e Prescrição no Direito Tributário, Eurico Marcos Diniz de Santi, 3ª Ed., Max Limonad, págs. 224/252.

(12) Execução Fiscal - Não Localizados Bens Penhoráveis - Suspensão do Processo - Prazo da Prescrição Qüinqüenal Intercorrente

(13) Art.151 - Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo.

Silvia Bellandi Paes de Figueiredo

Advogada. Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Mackenzie. Especialista em Direito Civil pela Escola Paulista de Direito. Especializanda em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas
Artigo - Federal - 2009/1861
Elaborado em 08/2009

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Rebelião - Carandiru - Responsabilidade Civil Objetiva - Dever de Indenizar (Transcrições)

EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO (CF, ART. 37, § 6º). CONFIGURAÇÃO. REBELIÃO NO COMPLEXO PENITENCIÁRIO DO CARANDIRU. RECONHECIMENTO, PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL, DE QUE SE ACHAM PRESENTES TODOS OS ELEMENTOS IDENTIFICADORES DO DEVER ESTATAL DE REPARAR O DANO. NÃO-COMPROVAÇÃO, PELO ESTADO DE SÃO PAULO, DA ALEGADA RUPTURA DO NEXO CAUSAL. CARÁTER SOBERANO DA DECISÃO LOCAL, QUE, PROFERIDA EM SEDE RECURSAL ORDINÁRIA, RECONHECEU, COM APOIO NO EXAME DOS FATOS E PROVAS, A INEXISTÊNCIA DE CAUSA EXCLUDENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO. INADMISSIBILIDADE DE REEXAME DE PROVAS E FATOS EM SEDE RECURSAL EXTRAORDINÁRIA (SÚMULA 279/STF). DOUTRINA E PRECEDENTES EM TEMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE SE AJUSTA À JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO IMPROVIDO.

DECISÃO: O recurso extraordinário a que se refere o presente agravo de instrumento foi interposto contra acórdão, que, confirmado, em sede de embargos de declaração (fls. 101/103), pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, está assim ementado (fls. 96):

“RESPONSABILIDADE CIVIL – DETENTO FALECIDO EM REBELIÃO OCORRIDA NA CASA DE DETENÇÃO – INDENIZAÇÃO DEVIDA – EMBARGOS INFRINGENTES COM VOTO VENCIDO QUE ENTENDE IMPROCEDENTE A AÇÃO – EMBARGOS REJEITADOS.” (grifei)

O Estado de São Paulo, no apelo extremo em questão, alega que, “Ao apontar a responsabilidade estatal pelo episódio, desconsiderou o E. Tribunal o fato de que os agentes policiais agiram no estrito cumprimento do dever legal, em contraposição à injusta agressão dos amotinados, durante rebelião nas dependências da Casa de Detenção” (fls. 109 – grifei).

O exame destes autos convence-me de que não assiste razão ao Estado ora agravante, quando sustenta que o estrito cumprimento de dever legal e a prática de legítima defesa - que, alegadamente, teriam pautado a conduta de seus agentes - bastariam para descaracterizar a responsabilidade civil objetiva do Poder Público a respeito do evento danoso em causa.

Com efeito, a situação de fato que gerou o trágico evento narrado neste processo põe em evidência a configuração, no caso, de todos os pressupostos primários que determinam o reconhecimento da responsabilidade civil objetiva da entidade estatal ora agravante.

Como se sabe, a teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros, desde a Carta Política de 1946, revela-se fundamento de ordem doutrinária subjacente à norma de direito positivo que instituiu, em nosso sistema jurídico, a responsabilidade civil objetiva do Poder Público, pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, por ação ou por omissão (CF, art. 37, § 6º).

Essa concepção teórica - que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, tanto no que se refere à ação quanto no que concerne à omissão do agente público - faz emergir, da mera ocorrência de lesão causada à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano moral e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais, não importando que se trate de comportamento positivo (ação) ou que se cuide de conduta negativa (omissão) daqueles investidos da representação do Estado, consoante enfatiza o magistério da doutrina (HELY LOPES MEIRELLES, “Direito Administrativo Brasileiro”, p. 650, 31ª ed., 2005, Malheiros; SERGIO CAVALIERI FILHO, “Programa de Responsabilidade Civil”, p. 248, 5ª ed., 2003, Malheiros; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Curso de Direito Administrativo”, p. 90, 17ª ed., 2000, Forense; YUSSEF SAID CAHALI, “Responsabilidade Civil do Estado”, p. 40, 2ª ed., 1996, Malheiros; TOSHIO MUKAI, “Direito Administrativo Sistematizado”, p. 528, 1999, Saraiva; CELSO RIBEIRO BASTOS, “Curso de Direito Administrativo”, p. 213, 5ª ed., 2001, Saraiva; GUILHERME COUTO DE CASTRO, “A Responsabilidade Civil Objetiva no Direito Brasileiro”, p. 61/62, 3ª ed., 2000, Forense; MÔNICA NICIDA GARCIA, “Responsabilidade do Agente Público”, p. 199/200, 2004, Fórum, v.g.), cabendo ressaltar, no ponto, a lição expendida por ODETE MEDAUAR (“Direito Administrativo Moderno”, p. 430, item n. 17.3, 9ª ed., 2005, RT):

“Informada pela ‘teoria do risco’, a responsabilidade do Estado apresenta-se hoje, na maioria dos ordenamentos, como ‘responsabilidade objetiva’. Nessa linha, não mais se invoca o dolo ou culpa do agente, o mau funcionamento ou falha da Administração. Necessário se torna existir relação de causa e efeito entre ação ou omissão administrativa e dano sofrido pela vítima. É o chamado nexo causal ou nexo de causalidade. Deixa-se de lado, para fins de ressarcimento do dano, o questionamento do dolo ou culpa do agente, o questionamento da licitude ou ilicitude da conduta, o questionamento do bom ou mau funcionamento da Administração. Demonstrado o nexo de causalidade, o Estado deve ressarcir.” (grifei)

É certo, no entanto, que o princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite abrandamento e, até mesmo, exclusão da própria responsabilidade civil do Estado nas hipóteses excepcionais (de todo inocorrentes na espécie em exame) configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior - ou evidenciadoras de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50 - RTJ 163/1107-1109, v.g.).

Impõe-se destacar, neste ponto, na linha da jurisprudência prevalecente no Supremo Tribunal Federal (RTJ 163/1107-1109, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), que os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o “eventus damni” e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva imputável a agente do Poder Público, que, nessa condição funcional, tenha incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do seu comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 131/417).

A compreensão desse tema e o entendimento que resulta da exegese dada ao art. 37, § 6º, da Constituição foram bem definidos e expostos pelo Supremo Tribunal Federal em julgamentos cujos acórdãos estão assim ementados:

“RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL.

- A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público.

- Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o ‘eventus damni’ e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 131/417).

- O princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior - ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50). (...).”
(RTJ 163/1107-1108, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

“- Recurso extraordinário. Responsabilidade civil do Estado. Morte de preso no interior do estabelecimento prisional. 2. Acórdão que proveu parcialmente a apelação e condenou o Estado do Rio de Janeiro ao pagamento de indenização correspondente às despesas de funeral comprovadas. 3. Pretensão de procedência da demanda indenizatória. 4. O consagrado princípio da responsabilidade objetiva do Estado resulta da causalidade do ato comissivo ou omissivo e não só da culpa do agente. Omissão por parte dos agentes públicos na tomada de medidas que seriam exigíveis a fim de ser evitado o homicídio. 5. Recurso conhecido e provido para condenar o Estado do Rio de Janeiro a pagar pensão mensal à mãe da vítima, a ser fixada em execução de sentença.”
(RTJ 182/1107, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - grifei)

É por isso que a ausência de qualquer dos pressupostos legitimadores da incidência da regra inscrita no art. 37, § 6º, da Carta Política basta para descaracterizar a responsabilidade civil objetiva do Estado, especialmente quando ocorre circunstância que rompe o nexo de causalidade material entre o comportamento do agente público e a consumação do dano pessoal ou patrimonial infligido ao ofendido.

Estabelecidas tais premissas, passo ao exame destes autos. E, ao fazê-lo, observo que as circunstâncias do presente caso - apoiadas em pressupostos fáticos soberanamente reconhecidos pelo Tribunal “a quo” - evidenciam que todos os elementos identificadores da responsabilidade civil objetiva do Estado acham-se demonstrados no caso ora em análise, especialmente o nexo de causalidade material (que restou plenamente configurado) e cuja ruptura a parte ora agravante, que alegara a ocorrência de causa excludente de sua responsabilidade civil, não conseguiu demonstrar.

Daí a correta observação feita pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, quando do julgamento da apelação cível interposta pela parte ora agravante (fls. 81/82):

“Com a prisão do indivíduo, assume o Estado o dever de cuidar de sua incolumidade física, quer por ato do próprio preso (suicídio), quer por ato de terceiro (agressão perpetrada por outro preso).

Assim, ante a rebelião que eclodiu no Pavilhão 9, da Casa de Detenção, tinha o Estado o dever de proteger a incolumidade física dos presos e dos próprios revoltosos, uns dos atos dos outros. Sua intervenção no episódio era, portanto, de rigor.

E ocorrendo ofensa à integridade física e morte do detento, é seu dever arcar com a indenização correspondente. A propósito, ressalta RUY BARBOSA: - ‘a legalidade do ato, ainda que irrepreensível, não obsta à responsabilidade civil da administração desde que haja dano a um direito’ (‘A Culpa Civil das Administrações Públicas’ – 1898, Rio, pág. 67).

Tal dever somente restaria afastado se a ação causadora do evento danoso tivesse ocorrido em legítima defesa própria (entenda-se: - do agente policial) ou de terceiro (de outro preso) que, no momento, estaria sendo agredido ou na iminência de o ser, frise-se, pelo detento morto.

Mas mesmo encontrando-se nessa situação lícita (legítima defesa), se tivesse produzido, com sua ação, a morte de outrem não envolvido no fato (‘aberratio ictus’), sua seria também a obrigação de indenizar, pois a ação, apesar de necessária, foi agressiva, atingindo quem não estava em posição de ataque (art. 1519 do Código Civil).

Assim, para afastar sua obrigação de reparar o dano, deveria a Fazenda do Estado demonstrar que o detento falecido, Francisco Ferreira dos Santos, estava, no momento de sua morte, agredindo os policiais ou outro preso. Mas esta prova não foi produzida (o ‘onus probandi’ é seu). Como não a produziu, certa é sua obrigação de indenizar.” (grifei)

Inquestionável, desse modo, que o Tribunal de Justiça local – ao reconhecer não comprovada, pelo Estado de São Paulo, a ocorrência da alegada causa de exclusão da responsabilidade estatal – assim decidiu com apoio no conjunto probatório subjacente ao pronunciamento jurisdicional em referência.

Esse dado assume relevo processual, pois a discussão ora suscitada pelo Estado de São Paulo - em torno da pretendida existência, na espécie, de causa excludente de responsabilidade - revela-se incabível em sede de recurso extraordinário, por depender do exame de matéria de fato, de todo inadmissível na via do apelo extremo.

Como se sabe, o recurso extraordinário não permite que se reexaminem, nele, em face de seu estrito âmbito temático, questões de fato ou aspectos de índole probatória (RTJ 161/992 – RTJ 186/703). É que o pronunciamento do Tribunal “a quo” sobre matéria de fato reveste-se de inteira soberania (RTJ 152/612 – RTJ 153/1019 – RTJ 158/693, v.g.).

Impende destacar, neste ponto, que esse entendimento (inadmissibilidade do exame, em sede recursal extraordinária, da existência, ou não, de causa excludente de responsabilidade), tratando-se do tema suscitado pela parte ora agravante, tem pleno suporte no magistério jurisprudencial desta Suprema Corte (AI 411.502/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – AI 586.270/RJ, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA – RE 508.315/CE, Rel. Min. ELLEN GRACIE – RE 595.267/SC, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, v.g.):

“ACÓRDÃO QUE DECIDIU CONTROVÉRSIA ACERCA DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO COM BASE NA PROVA DOS AUTOS. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 37, § 6.º, E 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Impossibilidade da abertura da via extraordinária em razão da incidência, na hipótese, do óbice das Súmulas 279, 282 e 356 desta Corte.
Agravo desprovido.”
(AI 391.371-AgR/RJ, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - grifei)

Cumpre ressaltar, por tal razão, em face do caráter soberano do acórdão recorrido (que reconheceu, com apoio no exame de fatos e provas, a ausência de demonstração da ruptura do nexo causal sustentada pelo Estado de São Paulo), que o Tribunal de Justiça interpretou, com absoluta fidelidade, a norma constitucional que consagra, em nosso sistema jurídico, a responsabilidade civil objetiva do Poder Público.

Com efeito, o acórdão impugnado em sede recursal extraordinária, ao fazer aplicação do preceito constitucional em referência (CF, art. 37, § 6º), reconheceu, com inteiro acerto, no caso em exame, a cumulativa ocorrência dos requisitos concernentes (1) à consumação do dano, (2) à conduta dos agentes estatais, (3) ao vínculo causal entre o evento danoso e o comportamento dos agentes públicos e (4) à ausência de qualquer causa excludente de que pudesse eventualmente decorrer a exoneração da responsabilidade civil do Estado de São Paulo.

Cabe acentuar, por relevante, que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar controvérsia virtualmente idêntica à versada nesta causa, proferiu decisão que se reflete, por igual, no presente julgamento (RTJ 140/636, Rel. Min. CARLOS VELLOSO).

Essa orientação jurisprudencial - cabe enfatizar - reflete-se no magistério da doutrina (RUI STOCO, “Tratado de Responsabilidade Civil – Doutrina e Jurisprudência”, p. 1.204, 7ª ed., 2007, RT; ARNALDO RIZZARDO, “Responsabilidade Civil”, p. 362 e 369/371, 1ª ed., 2005, Forense; JOSIVALDO FÉLIX DE OLIVEIRA, “A Responsabilidade do Estado por ato lícito”, p. 74/82, Editora Habeas; GUILHERME COUTO DE CASTRO, “A responsabilidade civil objetiva no direito brasileiro”, p. 52/55, 3ª ed., 2000, Forense; CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, “Curso de Direito Administrativo”, p. 995/997, 1002 e 1026/1027, 26ª ed., 2009, Malheiros; GIANNA CARLA RUBINO LOSS, “Responsabilidade Civil do Estado por Atos Lícitos”, “in” Cadernos do Ministério Público do Paraná, vol. 8, nº 01, janeiro/março de 2005, p. 08/12, e JOSÉ ANTONIO LOMONACO e FLÁVIA VANINI MARTINS MARTORI, “A Responsabilidade Patrimonial do Estado por Ato Lícito”, “in” Revista Nacional de Direito e Jurisprudência nº 06, Ano 1, Junho de 2000, p. 23/24), valendo referir, ante a pertinência de suas observações, o preciso (e sempre valioso) entendimento de YUSSEF SAID CAHALI (“Responsabilidade Civil do Estado”, p. 44, item n. 3.5, 3ª ed., 2007, RT):

“A responsabilidade civil do Estado, com base no risco administrativo, que admite pesquisa em torno da culpa do particular, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade estatal, ocorre, em síntese, diante dos seguintes requisitos: a) do dano; b) da ação administrativa; e c) desde que haja nexo causal entre o dano e a ação administrativa. A consideração no sentido da licitude da ação administrativa é irrelevante, pois o que interessa é isto: sofrendo o particular um prejuízo, em razão da atuação estatal, regular ou irregular, no interesse da coletividade, é devida a indenização, que se assenta no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais.” (grifei)

Sendo assim, e pelas razões expostas, nego provimento ao presente agravo de instrumento, eis que se revela inviável o recurso extraordinário a que ele se refere.

Publique-se.
Brasília, 05 de outubro de 2009.
Ministro CELSO DE MELLO - Relator
Fonte STF
AI 299125/SP*

Da aplicação retroativa da nova redação do artigo 43 e parágrafos da Lei 8212/91 sob o enfoque da Justiça do Trabalho

Introdução

O presente trabalho tem como escopo demonstrar o conflito de decisões que sucedem após a edição da Medida Provisória 449/2008 no que pertine a aplicação retroativa da nova redação do artigo 43 e parágrafos da lei 8212/91.

Demonstrar-se-á que após a pacificação pelo C. Tribunal Superior do Trabalho sobre o momento exato do recolhimento previdenciário oriundo do labor Obreiro, a Medida Provisória editada pelo Governo Federal, reascendeu novamente a discussão nos Tribunais, no entanto, tendo como ponto principal a aplicação retroativa ou não da modificação legal.

Nesse sentido, será apresentado o presente trabalho voltado basicamente para demonstrar o entendimento que vem sendo adotado pelos Magistrados, antes da sedimentação da polêmica pelo C. TST.

Do Posicionamento Jurisprudencial

Com a promulgação da Constituição da República de 1988, as contribuições sociais, incluindo as relativas a Seguridade Social (Previdenciárias), ganharam enfoque constitucional tributário, o que pode ser extraído do artigo 195.

Posteriormente, a Emenda Constitucional n. 20 atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para executar de ofício as contribuições sociais que forem reconhecidas como devidas em reclamação trabalhista.

A partir desse momento, o INSS (hoje União) começou a travar perante a Justiça do Trabalho uma verdadeira batalha jurídica com os empregadores referente ao momento adequado do recolhimento das contribuições previdenciárias.

Entendia a União que a época própria para o pagamento das contribuições previdenciárias seria o da prestação de serviço do empregado para o empregador. Para a União o débito previdenciário deveria ser apurado pelo regime de competência.

Por outro lado, entendiam os empregadores que a incidência da referida contribuição aconteceria no momento do pagamento dos valores devidos ao trabalhador, sendo este o fato gerador da obrigação previdenciária. Sendo os valores reconhecidos somente na Justiça do Trabalho, somente após a liquidação e intimação para o recolhimento é que seriam devidos estes.

Portanto, para os Empregadores, o regime a ser apurado do débito previdenciário seria o de caixa.

Após longos debates e manifestações sobrecarregando a Justiça do Trabalho, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho sedimentou o entendimento no sentido de que o regime adotado seria o de caixa, cujo recolhimento das contribuições previdenciárias ocorreria somente após o reconhecimento perante o Poder Judiciário do crédito do empregado.

Nesse sentido, cita-se o Provimento 02/1993/TST - CGJT, posteriormente incorporado ao artigo 83 da Consolidação dos Provimentos da Justiça do Trabalho, in verbis:

Art. 5º O fato gerador da incidência da contribuição previdenciária, constitutiva do débito, é o pagamento de valores alusivos a parcelas de natureza remuneratória (salário-de-contribuição), integral ou parcelado, resultante de sentença condenatória ou de conciliação homologada, efetivado diretamente ao credor ou mediante depósito da condenação para extinção do processo ou liberação de depósito judicial ao credor ou seu representante legal" (1)

Esse posicionamento do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, foi amparado no artigo 276 do Decreto 3048/1999 e na antiga redação do artigo 43 da lei 8212/91, sem as alterações provocadas pela Medida Provisória, o que se extrai, dos julgados de suas turmas, incluindo, nestes, os mais recentes, in verbis

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR. JUROS E MULTA. Define o caput do art. 276 do Decreto nº 3048/99 que, na existência de pagamentos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o recolhimento dos valores devidos à seguridade social será feita no dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença e, portanto, não se há de falar que o devedor está em mora antes dessa data. Precedentes desta Corte. Agravo de Instrumento a que se nega provimento. (TST - AIRR - 01556.2004.045.015.40.9 - 7ª Turma - Rel. Min. Pedro Paulo Manus, DEJT 08.05.2009)(2)

RECURSO DE REVISTA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR. ACRÉSCIMOS LEGAIS. Apenas com a caracterização da natureza salarial e com o pagamento do crédito devido ao empregado é que nasce o fato gerador para o pagamento da penalidade pelo recolhimento em atraso. Destarte, é a partir do pagamento do crédito trabalhista que nasce o direito ao recolhimento e não pela prestação de serviços remunerada, cuja controversa apenas foi solucionada por ocasião de decisão judicial. Recurso de Revista conhecido e desprovido. (TST - RR - 00471.2007.136.015.00.9 - 6ª Turma - Rel. Min. Aloysio Correa da Veiga, DJET 08.05.2009)(3)

Com efeito, dispunha os dispositivos legais utilizados como fundamentos para a pacificação do entendimento jurisprudencial, in verbis:

Art. 276. Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o recolhimento das importâncias devidas à seguridade social será feito no dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença. (4)

Art. 43. Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o juiz, sob de responsabilidade, determinará o imediato recolhimento das importâncias devidas à seguridade social. (5)

Entretanto, com a edição da Medida Provisória 449/2008, convertida na lei 11941/2009, foi alterado o artigo 43 da lei 8212/91, que adotando o posicionamento defendido pela União em suas manifestações junto ao Poder Judiciário, fixou o regime de competência para o recolhimento das contribuições previdenciárias, ou seja, fixou o período da prestação de serviços como fato gerador para pagamento.

Atualmente, dispõe o parágrafo segundo do artigo 43 da lei 8212/91, com sua nova redação, in verbis:

Art. 43. (...)
(...)
§ 2º Considera-se ocorrido o fato gerador das contribuições sociais na data da prestação do serviço. (Incluído pela Lei 11.941, de 2009).(6)

Acontece que a tendência natural é a dos Magistrados da Justiça do Trabalho adotarem a modificação legal determinada na Medida Provisória convertida na lei 11941/2009.

Entretanto, um ponto que tem provocado polêmica, discussões e decisões conflitantes na Justiça Especializada do Trabalho refere-se à aplicação da modificação introduzida para os casos em que os fatos ocorreram antes da entrada em vigor da referida norma.

Entendem alguns Magistrados que a alteração provocada pela Medida Provisória tem aplicação imediata, abrangendo, inclusive, os fatos ocorridos anteriormente. Para estes, "não há que se falar em retroação legal, porque o que ocorreu, na verdade foi mera regulamentação, pela Medida Provisória em comento 499, de 03.12.2008, da forma de apuração da contribuição previdenciária" (TRT - 3ª R- EDAP - 01262.2007.112.03.00.8 - 4ª Turma - Rel. Des. Julio Bernardo do Carmo, DEJT 17.08.2009) (7)

O mesmo posicionamento adotou o Juiz Eduardo Aurélio P. Ferri no processo 02448.2006.137.03.00.0, cuja ementa do julgado ora transcreve, in verbis:

EMENTA: CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ÉPOCA PRÓPRIA PARA PAGAMENTO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 34/35 E 43 DA LEI 8212/91 C/C ART. 879, §4º CLT. Se a mora do executado se materializou a partir da data da prestação de serviço, conforme redação do §2º do art. 43 da Lei 8212 dada pela MP nº 449 de 03/12/2008, e não a partir do dia 02 (dois) do mês seguinte ao da liquidação da sentença , imperativa a condenação ao pagamento da multa e dos juros de mora na forma dos arts. 34/35 da Lei 8.212/91 c/c o art. 879, §4º/CLT, afastada a aplicação do art. 276 do Decreto 3.048/99 à espécie. (TRT - 3ª R- AP - 02448.2006.137.03.00.0 - 4ª Turma - Rel. Juiz Conv. Eduardo Aurélio P. Ferri, DEJT 17.08.2009) (8)

E ainda o Ilustre Desembargador Luiz Otávio Linhares Renault no processo 00145.2007.114.03.00.0, complementa asseverando que "nada mudou, como essência, na base de cálculo da contribuição previdenciária, s.m.j, apenas foi esclarecido pela MP 449/2008, convertida na lei 11941/2009, qual seria o fato gerador da contribuição - a prestação dos serviços - e não o regime de caixa como entendia considerável parcela da jurisprudência." (TRT - 3ª R- AP - 00145.2007.114.03.00.0 - 4ª Turma - Rel. Des. Luiz Otávio Linhares Renault, DEJT 10.08.2009) (9)

Tem-se, portanto, entendimento pela aplicação imediata da MP 449/2008, inclusive com posicionamento pela retroatividade dos acréscimos legais previstos na nova redação da legislação.

No entanto, para outros Magistrados, a nova redação dada ao art. 43 da Lei n 8212/91 pela MP 449/2008 não podem alcançar situações jurídicas constituídas por sentença ou por acordo em processo do trabalho anterior a sua vigência, posto que, a alteração não retroage no tempo para incidir sobre fatos pretéritos constituídos por título judicial exequendo, in verbis:

EMENTA: CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. IRRETROATIVIDADE DA LEI. A nova redação dada ao art. 43 da lei 8212/91, pela Medida Provisória nº 449, de 03/12/2008 institui os 'acréscimos legais moratórios' até então não previstos por lei para as situações jurídicas constituídas por sentença trabalhista ou acordo judicialmente homologado pela Justiça do Trabalho. Assim, tendo em vista o princípio da irretroatividade da lei, que se encontra expresso no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal de 1988, seus efeitos não podem alcançar situações jurídicas constituídas por sentença ou por acordo em processo do trabalho anteriores à sua vigência. (TRT - 3ª R- AP - 00089.2006.005.03.00.3 - 3ª Turma - Rel. Juiz Conv. Danilo Siqueira de C. Faria, DEJT 17.08.2009) (10)

EMENTA. EXECUÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. IRRETROATIVIDADE DA LEI. É irrelevante no presente caso concreto que a Medida Provisória nº 449, de 04/12/2008, tendo alterado a redação dos parágrafos 2º e 3º do art. 43 da Lei nº 8212, de 24/07/1991, já que ela não retroage no tempo para incidir sobre os fatos pretéritos constituídos pelo título judicial exequendo. (TRT - 3ª R- AP - 00776.2004.025.03.00.1 - 3ª Turma - Rel. Juiz Conv. Milton V. Thibau de Almeida, DEJT 03.08.2009) (11)

EMENTA. EXECUÇÃO CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR. A implementação da regra constitucional sobre a execução das contribuições previdenciárias na Justiça do Trabalho rege-se pelas disposições do art. 43 da Lei 8212/91, que apontava como fato gerador o 'o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária'. Vale dizer, é o pagamento do crédito trabalhista que gera a contribuição previdenciária decorrente e não a simples prestação de serviços remunerada, cuja controversa só se vem discriminada pela ação judicial. Desse modo, ainda que o art. 43 acima referido tenha sido alterado pela inclusão dos §§2º e 3º (Medida Provisória 449/2008), tal fato não impõe a modificação da metodologia de cálculo anteriormente adotada, em face do princípio da irretroatividade da norma" (TRT - 3ª R- AIAP - 01290.2006.015.03.40.0 - 8ª Turma - Relª. Des. Cleube de Freitas Pereira, DEJT 04.05.2009) (12)

Corroborando com esse entendimento que defende a inaplicabilidade da MP 449/2008 para os casos pretéritos à nova redação da legislação por força da irretroatividade, pode-se acrescer ainda o entendimento amparado nos Princípios da Segurança Jurídica - que veda a aplicação retroativa de nova interpretação de lei - e do TEMPUS REGIT ACTUM, principalmente pela inexistência de qualquer ressalva à retroatividade dos novos preceitos.

Nesse sentido cita-se:

EMENTA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR, LEI 11491/09. IRRETROATIVIDADE. Em nome da preservação da segurança jurídica, também vigora no direito tributário o princípio da irretroatividade da lei, inclusive quando define o fato gerador da obrigação tributária, o que quer dizer que a lei deve ser anterior ao fato gerador do tributo por ela criado ou majorado (CF, art. 150, III, "a"). Anteriormente ao advento da Lei 11941/09 era incontroverso, perante esta Eg. Turma, que o fato gerador da obrigação tributária relativa ao recolhimento das contribuições previdenciárias ocorria com o pagamento das parcelas salariais reconhecidas no título executivo. Dessa forma, constituído o título executivo anteriormente à citada lei, o fato gerador da contribuição previdenciária continua sendo o pagamento de parcelas salariais ao empregado, sob pena de aplicação retroativa da norma. Consequentemente, para esses títulos, os juros, multa e atualização monetária somente serão cabíveis na hipótese de não pagamento da contribuição previdenciária após o dia dois mês seguinte ao do pagamento das parcelas de natureza salarial ao exequente, nos termos do art. 276, 'caput' do Decreto n. 3048/99, ainda aplicável à hipótese dos autos. (TRT - 3ª R- AP - 00930.2006.001.03.00.7 - 3ª Turma - Rel. Juiz Conv. Vitor Salino de M. Eca, DEJT 17.08.2009) (13)

EMENTA. EXECUÇÃO CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS - SENTENÇA CONDENATÓRIA - JUROS E MULTA DE MORA - INOVAÇÃO LEGISLATIVA - TEMPUS REGIT ACTUM. Também se submete ao princípio tempus regit actum o recolhimento de contribuições previdenciárias, incidentes sobre valores pagos em virtude de sentença condenatória transitada em julgado e relativa a contrato de trabalho cuja vigência é anterior à edição da Medida Provisória 449/2008. A inovação legislativa nessa matéria, sem ressalva quanto à retroatividade, aplica-se para o futuro. (TRT - 3ª R- AP - 02538.2006.136.03.00.4 - 2ª Turma - Rel. Juiz Conv. Des. Sebastião Geraldo de Oliveira, DEJT 05.08.2009) (14)

Assim, por todo o demonstrado acima, com a edição da Medida Provisória 449/2008, novamente será necessário a pacificação da polêmica, pelo Tribunal Superior, sobre a aplicação retroativa do recolhimento das contribuições previdenciárias para os fatos ocorridos antes da modificação legal, ante a existência de posicionamentos conflitantes por parte dos Magistrados, o que deve acontecer logo, para atender o Princípio da Segurança Jurídica.

Conclusão

Conforme se extrai ao longo de todo o trabalho, a Medida Provisória 449/2008 reascendeu novamente na Justiça do Trabalho a polêmica sobre as contribuições previdenciárias oriundas do labor, no entanto, sob um novo enfoque, qual seja, o da aplicação retroativa ou não da modificação legal.

Posições conflitantes sobressaltam, no Poder Judiciário, sempre com fundamentos válidos, plausíveis e muito bem expostos.

Assim, em breve, caberá ao C. Tribunal Superior, novamente, debruçar sobre essas questões antagônicas para sedimentar o posicionamento sobre a retroatividade ou não da alteração legislativa provocada pela Medida Provisória para os casos ocorridos antes da modificação legal, para garantir ao jurisdicionado o princípio natural da segurança jurídica das relações.

Referências

(1) BRASIL. Provimento 02/1993. Dispõe acerca do procedimento a ser observado no que diz respeito à incidência e ao recolhimento de contribuições devidas à Previdência Social sobre pagamento de direitos nas ações ajuizadas na Justiça do Trabalho. Disponível na Internet: http://www.tst.gov.br/corregedoria_2009/paginas/ementario.htm. Acesso em: 25 de agosto de 2009.

(2) ______. Tribunal Superior do Trabalho. Agravo de Instrumento n. 01556.2004.045.015.40.9. Sétima Turma. Ministro Pedro Paulo Manus, julgado em 06.05.2009. Disponível na Internet: https://www.tst.jus.br. Acesso em: 25 de agosto de 2009.

(3) ______. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista n. 00471.2007.136.015.00.9. Sexta Turma. Ministro Aloysio Correa da Veiga, julgado em 29.04.2009. Disponível na Internet: https://www.tst.jus.br. Acesso em: 25 de agosto de 2009.

(4) ______. Decreto nº 3048, de 6 de maio de 1999. Aprova o Regulamento da Previdência Social, e dá outras providências. Disponível na Internet: http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto/D3048.htm. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(5) ______. Lei nº 8212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências. Disponível na Internet: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8212cons.htm. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(6) ______. Lei nº 8212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências. Disponível na Internet: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8212cons.htm. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(7) ______. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. Embargos de Declaração do Agravo de Petição n. 01262.2007.112.03.00.8. Quarta Turma. Des. Julio Bernardo do Carmo, julgado em 05.08.2009. Disponível na Internet: www.trt3.jus.br. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(8) ______. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. Agravo de Petição n. 02448.2006.137.03.00.0 Quarta Turma. Juz Convocado Eduardo Aurélio P. Ferri, julgado em 05.08.2009. Disponível na Internet: www.trt3.jus.br. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(9) ______. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. Agravo de Petição n. 00145.2007.114.03.00.0. Quarta Turma. Des. Luiz Otávio Linhares Renault, julgado em 29.07.2009. Disponível na Internet: www.trt3.jus.br. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(10) ______. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. Agravo de Petição n. 00089.2006.005.03.00.3. Terceira Turma. Juiz Convocado Danilo Siqueira de C. Faria, julgado em 05.08.2009. Disponível na Internet: www.trt3.jus.br. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(11) ______. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. Agravo de Petição n. 00776.2004.025.03.00.1. Terceira Turma. Juiz Convocado Milton V. Thibau de Almeida, julgado em 05.08.2009. Disponível na Internet: www.trt3.jus.br. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(12) ______. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. Agravo de Instrumento de Agravo de Petição n. 01290.2006.015.03.40.0. Oitava Turma. Des. Cleube de Freitas Pereira, julgado em 22.04.2009. Disponível na Internet: www.trt3.jus.br. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(13) ______. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. Agravo de Petição n. 00930.2006.001.03.00.7. Terceira Turma. Juiz Convocado Vitor Salino de M. Eca, julgado em 05.08.2009. Disponível na Internet: www.trt3.jus.br. Acesso em 26 de agosto de 2009.

(14) ______. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região. Agravo de Petição n. 02538.2006.136.03.00.4. Segunda Turma. Des. Sebastião Geraldo de Oliveira, julgado em 28.07.2009. Disponível na Internet: www.trt3.jus.br. Acesso em 26 de agosto de 2009.
Fonte - Fiscosoft
Rosendo de Fátima Vieira Júnior

Advogado Trabalhista em Belo Horizonte-MG. Pós-Graduado em Direito Social
Artigo - Previdenciário/Trabalhista - 2009/1184

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Atraso no pagamento de precatório possibilita o seqüestro de verbas públicas

O atraso no pagamento de valores constante de precatório possibilita o seqüestro de verbas públicas, nos termos do artigo 78, § 4º do ADCT. Com esse entendimento, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça determinou o seqüestro de recursos financeiros do Estado do Paraná para o pagamento de precatórios de mais de R$ 11 milhões devidos à Companhia Pinheiro Indústria e Comércio desde o ano 2000.

O pedido de seqüestro foi rejeitado pelo Tribunal de Justiça estadual com o fundamento de que a legislação não estabelece o início do prazo para o pagamento do precatório, mas apenas estipula que o débito deve ser pago no prazo de 10 anos. Assim, a moratória deve ser total, abrangendo todas as parcelas do precatório e não apenas uma delas.

Para o TJ do Paraná, se não ficar comprovada a omissão no orçamento, a moratória para pagamento das parcelas ou a quebra da cronologia, não há qualquer ilegalidade ou abuso do poder que autorize o seqüestro constitucional previsto no referido artigo.

A empresa recorreu ao STJ alegando que o indeferimento do pedido violou direito liquido e certo assegurado pela legislação, já que tal medida é cabível na hipótese de falta de pagamento de qualquer uma das parcelas devidas. Sustentou, ainda, que mesmo tendo sido incluído no orçamento estadual de 2000, o Estado não quitou sequer uma parcela do débito de R$ 11,7 milhões determinado por decisão judicial transitado em julgado.

Segundo a relatora, ministra Denise Arruda, a Emenda Constitucional 30/2000 estabeleceu dois regimes de pagamento de precatórios: o geral, que autoriza o sequestro de recursos exclusivamente para o caso de preterimento no direito de precedência; e o especial, em que o seqüestro de recursos públicos é autorizado nas hipóteses de preterição do direito de precedência, de vencimento de prazo ou em caso de omissão no orçamento (art. 78, § 4º do ADCT)

Citando precedente relatado pelo ministro Teori Zavascki, Denise Arruda destacou que a autorização para seqüestro prevista na legislação refere-se a cada uma das parcelas anuais da dívida, não havendo necessidade de se aguardar o decurso do prazo para pagamento da última parcela, como entendeu a Justiça paranaense.

Para a relatora, no caso em questão está claro que apesar de ter sido requisitado em 1999 e incluído no orçamento de 2000, o Estado não efetivou o pagamento de nenhuma parcela. Ou seja, na data da promulgação da Emenda Constitucional 30/2000, o referido precatório ainda se encontrava pendente de pagamento,o que enseja a aplicação da norma contida no artigo 78 do ADCT.

Assim, por unanimidade, a Turma acolheu o pedido de sequestro de recursos financeiros suficientes para o pagamento das prestações vencidas.
Fonte STJ - RMS 29014

domingo, 15 de novembro de 2009

Parcelamento de precatórios

Desde que iniciou a discussão da Pec nº 12/2006, já aprovada pelo Senado Federal, inúmeras propostas alternativas têm sido apresentadas pelas mais diversas instituições jurídicas e entidades de classe.

Esse fato demonstra, de um lado, a consciência geral de que é impossível exigir-se o pagamento imediato de milhares de precatórios acumulados ao longo do tempo, por leniência das instituições e autoridades competentes e, de outro lado, deixa clara a repulsa generalizada da sociedade àquela proposta de emenda que aniquila os direitos e garantias fundamentais do cidadão, além de atentar contra o princípio da independência e harmonia dos poderes, uns e outro protegidos pela cláusula pétrea.

Todas as propostas apresentadas até agora demonstram a preocupação com a preservação dos princípios constitucionais respeitando a ordem cronológica, a coisa julgada, o princípio da isonomia, dentre outros. E estão muito bem elaboradas demonstrando conhecimento da matéria. Algumas dessas propostas, contudo, esbarram contra princípios expressos de direito financeiro e se chocam contra preceitos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Sem querer desprezar trabalhos outros, pelo contrário, inspirando-nos em alguns desses trabalhos, formulamos uma proposta simples e prática que, se aprovada acabará com os complicados procedimentos representados pela cessão de créditos decorrentes de precatórios e, ao mesmo tempo, trará para a formalidade os negócios informais envolvendo a compra e venda desses precatórios, com deságio que chegam a 75% do seu valor de face.

Refiro-me ao pagamento dos precatórios pendentes pelo seu valor real, acrescido de juros legais, em títulos da dívida pública anuais, porém, resgatáveis, cada um deles, em parcelas trimestrais iguais e consecutivas nos prazos especificados.

Para respeitar a preferência absoluta dos precatórios alimentícios, bem como, para observar o princípio da isonomia, os precatórios alimentares teriam prazos menores de pagamento e os credores que estão há mais tempo de fila de espera receberiam em prazos menores também.

Estamos cientes que economistas já argumentaram que a emissão de títulos públicos provoca a expansão de base monetária, pelo que deve ser evitada. Entretanto, o argumento não procede.

Não se trata de emissão de títulos públicos como instrumentos de operação de crédito, como aconteceu com a autorização contida no art. 33 do ADCT, que redundou em desvios de recursos financeiros obtidos com a emissão indiscriminada de títulos públicos. Como ficaram apuradas pela CPI dos Precatórios, poucos precatórios foram pagos com a captação de recursos por meios desses títulos emitidos em montante bem superiores ao da dívida pública resultante de condenação judicial.

A nossa proposta é para pagamento de despesa pública decorrente de condenação judicial com títulos de dívida pública, a exemplo do que já ocorre no âmbito da União com referência ao pagamento da justa indenização de terras desapropriadas para fins de reforma agrária. A única novidade é a atribuição a esses títulos de poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora, se não resgatados nos respectivos vencimentos.

A não realização de receita tributária corresponderá à extinção da despesa pública em igual montante. Essa forma de extinção do crédito tributário dar-se-á por meio de títulos públicos anuais (resgatáveis em parcelas trimestrais) de sorte a não comprometer o princípio do equilíbrio orçamentário.

Toda entidade política costuma incluir na respectiva Lei Orçamentária dotações para pagamento de juros da dívida pública e para amortização da dívida pública. É só cuidar de reforçar essas dotações, quer originalmente, quer por meio de abertura de créditos adicionais suplementares no decorrer do exercício. Haverá apenas alteração nas denominações das dotações orçamentárias existentes a título de pagamento de débitos resultantes de condenação judicial. Aliás, nos termos do § 7º, do art. 30 da LRF os precatórios judiciais não pagos durante a execução do orçamento em que houverem sido incluídos integram a dívida consolidada, para fins de aplicação dos limites. Dívida consolidada corresponde ao montante apurado sem duplicidade, das obrigações financeiras do ente político, assumidas em virtude de leis, contratos, convênios ou tratados e da realização de operações de crédito, para amortização em prazo superior a doze meses (art. 29, I da LRF). No caso, como os títulos são emitidos para pagamento de despesas públicas não afetariam os limites de endividamento de cada entidade política. Consigne-se, por fim, que o poder liberatório, na forma proposta, somente surge com o inadimplemento do poder público.

Pergunta-se, onde a expansão da base monetária? Por acaso, a despesa pública representada por precatório e consignada no orçamento anual se não for paga em títulos não teria que ser paga em dinheiro? A única forma de não pressionar a demanda de dinheiro é continuar com os calotes.

Esses títulos podem ser transferidos por meio de endosso para circulação antes ou a partir de seus vencimentos, conforme decisão do Parlamento Nacional, porém, em qualquer hipótese, adquirindo o poder liberatório somente em face do inadimplemento do ente político devedor. Com isso desburocratizam-se as cessões de créditos, aumentando a eficácia e a segurança jurídica dos negócios e concorrendo para a valorização dos títulos no mercado.

Para melhor compreensão transcrevemos a seguir a minuta de nossa proposta que insere um artigo no ADCT, nos seguintes termos:

Art. . Ressalvados os créditos definidos em lei como de pequeno valor e os que estão sob os efeitos do art. 78 do ADCT, os precatórios pendentes na data da promulgação desta Emenda serão pagos pelo seu valor real, acrescido de juros legais, em títulos da dívida pública anuais, resgatáveis cada um deles em parcelas trimestrais, iguais e consecutivas, nos prazos adiante especificados, a partir de 1º de julho de 2010, por decisão do Poder Executivo até 180 dias da promulgação desta Emenda:
I - os débitos de natureza alimentar independentemente do valor:
a) em até 4 (quatro) anos os vencidos há mais de 7 (sete) anos;
b) em até 5 (cinco) anos os vencidos há mais de 5 (cinco) anos;
c) em até 6 (seis) anos nos demais casos;
II - os débitos de outra natureza:
a) em até 4 (quatro) anos os que não excederem a três mil salários mínimos;
b) em até 5 (cinco) anos os vencidos há mais de 7 (sete) anos e superiores a três mil salários mínimos;
c) em até 6 (seis) anos os vencidos há 6 (seis) anos e superiores a três mil salários mínimos;
d) em até 7 (sete) anos os vencidos há 5 (cinco) anos e superiores a três mil salários mínimos;
e) em até 8 (oito) anos os vencidos há 4 (quatro) anos e superiores a três mil salários mínimos;
f) em até 9 (nove) anos os vencidos a 3 (três) anos e superiores a três mil salários mínimos;
g) em até 10 (dez) anos nos demais casos.
§ 1º Serão emitidos tantos títulos quantos forem os números de anos para pagamento dos débitos, contendo cada um desses títulos parcelas resgatáveis trimestralmente em valores iguais e consecutivos;
§ 2º O atraso no pagamento de qualquer parcela trimestral importará no vencimento antecipado da totalidade do débito representado pelo título público inadimplido, hipótese em que esse título adquirirá poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora, facultada a cessão de direitos por simples endosso, sem prejuízo do seqüestro a requerimento do credor, independentemente da quebra da ordem cronológica.
§ 3º Não têm aplicação os limites globais previstos nos incisos VI e VII, do art. 52 da Constituição relativamente aos títulos públicos emitidos na forma do § 1º.
§ 4º Na hipótese de não cumprimento dos precatórios do exercício até o dia 31 de dezembro de cada ano acarretará vencimento antecipado e automático dos títulos correspondentes ao exercício em que houve a inadimplência do poder público.

Não acreditamos em solução do problema na forma proposta pela Pec nº 12. Ainda que se fizesse total abstração dos aspectos de sua inconstitucionalidade o critério de pagamento em parcelas calculado sobre um percentual ínfimo da receita líquida das entidades políticas devedoras, sem indicação expressa de sua fonte de custeio, conduziria inexoravelmente a uma moratória em cascata. Os recursos financeiros do exercício seriam utilizados para pagamentos das parcelas de precatórios sob moratória, acarretando o represamento de futuros precatórios a serem objetos de nova moratória daqui a alguns anos. Isso é empurrar a dívida com a barriga como, aliás, querem os governantes que estão pressionando o Parlamento para aprovar, a toque de caixa, a Pec nº 12, verdadeira obra de Satanás.

Qualquer que seja a proposta é indispensável a inserção de dispositivo prevendo o poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora, na hipótese de inadimplemento. E seria oportuno que a cláusula do poder liberatório fosse incorporada, também, nas disposições permanentes da Constituição, a fim de prevenir novas moratórias. É preciso mudar a cultura do calote e da impunidade. Os governantes devem voltar a administrar de conformidade com a Lei Orçamentária Anual, onde deve ou deveria estar refletido o plano de ação governamental.
Fonte: Fiscosoft
Kiyoshi Harada

Sócio fundador da Harada Advogados Associados. Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Financeiro, Tributário e Administrativo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos - Cepejur. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo e ex Diretor da Escola Paulista de Advocacia.
Artigo - Federal - 2009/1859

Empresa consegue reduzir honorário de R$ 1,1 milhão para R$ 23,7 mil

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou os honorários advocatícios a serem pagos pela Jayme Wainberg S.A Indústria e Comércio de Enxovais em 0,2% do valor da causa. O valor exorbitante dos honorários de sucumbência fixados em ação de execução fiscal motivou sua redução.

A empresa recorrente apelou contra decisão de primeiro grau que extinguiu ação de consignação em pagamento, via títulos da dívida pública, por impossibilidade jurídica do pedido. Como conseqüência, a empresa foi condenada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que foram fixados em 10% sobre o valor da causa, atribuído em R$ 11,8 milhões.

Levando em consideração a “singeleza” do trabalho do procurador da Fazenda Pública na ação, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reduziu a verba honorária para 2% do valor causa. Ainda assim a empresa recorrente considerou o montante de R$ 237,3 mil muito elevado e recorreu ao STJ.

O relator, ministro Luiz Fux, destacou que a jurisprudência do STJ admite o conhecimento do recurso especial para alterar valores fixados a título de honorários advocatícios, para mais ou para menos, quando o montante se afasta do princípio da razoabilidade, distanciando-se do juízo de equidade e resultando em valor exorbitante ou irrisório.

Para o ministro Fux, é inequívoca a exorbitância da verba honorária arbitrada. Por isso ele alterou o valor para 0,2% sobre o valor da causa, o equivalente a R$ 23.733,00. O voto do relator foi acompanhado por todos os demais ministros da Primeira Turma.
Fonte: STJ Resp 939684

Hermès francesa pode utilizar marca no Brasil

Mantida decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que permitiu à grife francesa Hermès conviver em harmonia no território nacional com a brasileira Hermes. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou a tentativa da empresa brasileira Sociedade Comercial e Importadora Hermes de impedir que a companhia francesa explorasse os seus produtos no Brasil com a referida marca.

Ambas as empresas atuam no mesmo ramo de atividade; uma se destinando ao mercado de luxo, outra à venda por catálogos. As marcas traduzem expressões praticamente idênticas e a única diferença é o acento gráfico. A brasileira possui o registro junto ao INPI desde 1942 e tentava assegurar o direito de registro de exclusividade. A empresa francesa, por meio da Hermès International, ingressou com uma ação declaratória na Justiça, para também ter direito de utilizar a marca.

A Lei n. 9.279/96 confere o direito de exclusividade do uso da marca registrada junto ao INPI, mas a ação interposta pela empresa francesa foi julgada procedente com o argumento de que o público alvo era distinto e os produtos não se confundiam. “Um consumidor da grife Hermès jamais adquirirá um produto da Hermes por engano, e vice-versa”, assinalou a decisão. O Tribunal de Justiça do Rio confirmou a sentença.

Para a defesa, o Tribunal fluminense cometeu dois equívocos: violou o direito de exclusividade do titular da marca e aplicou de forma errada o princípio da especificidade, criando uma espécie de subclasse de produtos que leva em conta apenas o público-alvo, critério que não encontra respaldo legal.

Para o Tribunal do Rio, entretanto, por ser a Hermès uma empresa mundialmente conhecida, a marca seria notória. A empresa francesa – famosa por suas gravatas – foi fundada em Paris em 1837. Os magistrados utilizaram, no caso, o princípio da proteção extraterritorial às marcas notórias, da Convenção de Paris, que assegura o uso da marca, A defesa da Hermes brasileira, alegou que a Justiça confundiu a conceito de notoriedade, que só existe quando se confunde com o produto (caso da Gilette).

Um agravo de instrumento interposto pela Hermes do Brasil tentava trazer a discussão ao STJ, mas o recurso foi rejeitado pelo então relator, ministro Massami Uyeda, que negou a subida do recurso para análise ao STJ. Novo recurso foi apresentado pela empresa nacional, mas a Quarta Turma negou provimento ao fundamento de que a empresa não apresentou argumento capaz de “infirmar a decisão monocrática que pretende ver reformada”.

A matéria de mérito não foi analisada pela Corte. “O acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame dos fatos e provas, o atrai a incidência da Súmula n.º 7”, assinalou o relator Honildo Amaral de Mello Castro.
Fonte: STJ Ag 850487