Tributário - ISS
1. Introdução
Diante de fatores como o avanço tecnológico, combinado com a crescente transferência de atividades, antes praticadas pela própria empresa, aquilo que se pode resumir de terceirização, como os serviços de limpeza, vigilância, assistência técnica e, até mesmo, na fabricação(1), a atividade econômica de prestação de serviços se tornou extremamente desenvolvida e cada vez mais presente na vida de todos, cidadãos e empresas.
Uma conseqüência substancial vem à tona: o acréscimo da tributação sobre a prestação serviços de forma progressiva, fazendo com que, no "bolo" de arrecadação tributária, a participação e a importância do ISS apenas têm crescido, chamando a atenção de todos, empresários, especialistas e doutrinadores, refletindo, inclusive, na literatura tributária, cada vez mais rica, não apenas na publicação de artigos discutindo problemas específicos, como da edição de obras inteiras tratando exclusivamente sobre este tributo.
Prova disso é que, segundo estudo da Coordenação Geral de Política Tributária, da RFB (2007), entre 2002 e 2006, a participação do ISS, em relação ao PIB, cresceu de 0,53%, em 2002, para 0,66%, em 2006, num incremento bruto de 24,53%, enquanto que a participação do ICMS praticamente manteve-se estável, com 7,13%, em 2002, contra 7,39%, em 2006 e do IPI decresceu, passando de 1,36%, em 2002, para 1,22%, em 2006.
Assim, destaca-se como conseqüência direta, a importância de se estabelecer, nos municípios brasileiros, uma estrutura técnica de qualidade superior, da gestão tributária do ISS, em termos de qualificação do quadro técnico de auditores e demais servidores das Fazendas Municipais, no intuito desses profissionais se inteirarem por completo de toda a mecânica de incidência deste tributo, exigível sobre a atividade econômica de prestação de serviços.
Infelizmente, os números desta qualificação, levando-se em conta à quantidade de municípios brasileiros (5.564 municípios(2)), ficam muito prejudicados. Segundo o IBGE (2005), em 2002, apenas os municípios com população superior a 500 mil habitantes têm uma política tributária organizada, com os tributos de sua competência representando 60% (sessenta por cento), ou mais, de sua receita própria, além do fato de que, naquele mesmo ano, apenas 530 municípios não cobravam absolutamente nada de tributos, até pelo simples e impressionante fato de não estarem instituídos, ferindo expressamente, inclusive, a Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar nº 101, que estabelece, em seu art. 11:
Art. 11. Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação. (grifei)
Tudo isso significa que apenas as capitais e alguns municípios de suas regiões metropolitanas e alguns poucos casos cidades interioranas, têm preocupação de ter um corpo de servidores especializados e de investirem na sua capacitação, dando uma preparação mínima para um perfeito trabalho de verificação da incidência do ISS, principalmente um dos principais fundamentos para construção da regra-matriz de incidência do ISS, o seu aspecto espacial, objeto de estudo deste trabalho.
Como um dos fundamentos para elaboração da norma jurídica em sentido estrito (a regra-matriz de incidência), o aspecto espacial tem uma importância ímpar para o ISS, em face das muitas divergências doutrinárias e jurisprudenciais, especialmente no âmbito do STJ, em razão do que dispunha o DL-406/68 e, agora, a LC-116/03, que estabeleceram como regra geral, para fins de definir o município competente para lançar e cobrar o imposto, aquele em que se encontra o estabelecimento prestador, à exceção:
a) dos serviços definidos no DL-406/68, em seu art. 12, "b" (atividades de construção civil) e "c" (exploração de rodovias mediante cobrança de preço dos usuários, envolvendo execução de serviços de conservação, manutenção, melhoramentos para adequação de capacidade e segurança de trânsito, operação, monitoração, assistência aos usuários e outros definidos em contratos, atos de concessão ou de permissão ou em normas oficiais), e
b) com a revogação daqueles dispositivos, as atividades constantes dos incisos I a XXII do art. 3º da LC-116/03, em que o imposto é devido no local onde são executadas as atividades de prestação de serviços ali descritas.
Neste sentido, este trabalho se propõe ao estudo e por conseqüência, a desmistificação do seguinte problema: encontra-se presente na legislação competente, os critérios necessários para a identificação do aspecto espacial da regra-matriz de incidência tributária do ISS?
Em verdade, desde o surgimento do ISS, nos moldes em que está configurado atualmente, a partir da edição da Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, a doutrina, a jurisprudência e os principais interessados, os Municípios, vêm discutindo muito, no sentido de determinar qual o local da prestação dos serviços, ou seja, qual o Município onde o aspecto espacial do imposto ocorre, para fins de estabelecimento de quem é competente para cobrá-lo.
Afinal, como já mencionado, são 5.564 municípios, cada um competente para a instituição do imposto sobre serviços, um tributo que, conforme visto acima, apenas tem evoluído em termos de importância na vida econômica de todos. Precisa, portanto, ser adequadamente estudado, dissecado em toda sua formatação e, como será demonstrado adiante, a definição do aspecto espacial trará influência significativa para o estabelecimento dos demais critérios da regra-matriz.
2. Serviços: Conceito e sua tributação
Para Barreto (2005, p. 63): "É esforço de pessoas desenvolvendo em favor de outrem, com conteúdo econômico, sob regime de direito privado, em caráter negocial, tendente a produzir uma utilidade material ou imaterial." (grifei)
Portanto, algo feito por alguém ou empresa, para outro alguém ou outra empresa, por um preço previamente estabelecido, avaliado economicamente, sob regime contratual, com o objetivo de satisfação mútua, em termos de entrega de um bem, seja material(3) ou imaterial(4).
Martins (2004, p. 37) especializa o seu entendimento, corroborando a definição acima, afirmando que: "o entendimento do que seja serviços acha-se radicado na Economia (na idéia de serviço produzido, serviço bem econômico incorpóreo suscetível de apreciação econômica) e não no Direito (prestação de serviços - relação jurídica), embora o sistema jurídico tributário tenha adotado um conceito que se acha consignado numa classificação econômica."
Baptista (2005), não fornece um conceito direto mas, ao discorrer sobre o aspecto material da regra-matriz do imposto, vai descrevendo o que seria serviço para o Direito Tributário, a partir do contexto da própria Constituição e das diversas acepções do substantivo "serviço" que temos, a exemplo dos serviços gratuitos, dos serviços obrigatórios por lei ou por sanções, dos serviços por questões contratuais e nas diferenças entre as obrigações de "dar" e "de fazer".
O CTN, no art. 71, § 1º, com redação original e modificações do Ato Complementar nº 27, de 1966 e do Decreto-Lei nº 28, de 1966, considerava, para fins de tributação, pelo ISS, os serviços como sendo:
a) o fornecimento de trabalho, com ou sem utilização de máquinas, ferramentas ou veículos, a usuários ou consumidores finais (inciso I);
b) a locação de bens móveis (inciso II);
c) a locação de espaço em bens imóveis, a título de hospedagem ou para guarda de bens de qualquer natureza (inciso III); e
d) jogos e diversões públicas (inciso IV)
Com o advento do Ato Complementar nº 34, de 1967, dando nova redação ao § 1º, a classificação dos serviços, para fins do imposto, ficou sendo a seguinte:
a) locação de bens móveis (inciso I);
b) a locação de espaço em bens imóveis, a título de hospedagem ou para guarda de bens de qualquer natureza (inciso II);
c) jogos e diversões públicas (inciso III)
d) beneficiamento, confecção, lavagem, tingimento, galvanoplastia, reparo, conserto, restauração, acondicionamento, recondicionamento e operações similares, quando relacionadas com mercadorias não destinadas à produção industrial ou à comercialização (inciso IV);
e) execução, por administração ou empreitada, de obras hidráulica ou de construção civil, excluídas as contratadas com a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, autarquias e empresas concessionárias de serviços públicos assim como as respectivas subempreitadas (inciso V);
f) demais formas de fornecimento de trabalho, com ou sem utilização de máquinas, ferramentas ou veículos (inciso VI).
Este dispositivo, apesar de expressamente revogado pelo DL-406/68, posto que instituíra a Lista de Serviços, não conceituava a atividade "serviços". Ao contrário, apenas destacava quais estariam no campo de incidência do imposto, demonstrando o caráter eminentemente econômico dos serviços, para que fossem gravados pelo ISS.
E o que se percebe é exatamente o conceito econômico, isto é, a atividade de prestação de serviços, avaliada em moeda e, portanto, de natureza econômica, ou seja, com fins econômicos ou de finalidade lucrativa, mesmo que, eventualmente, haja prejuízos na operação, individualmente ou coletivamente.
No entanto, esta natureza econômica não é corroborada por parte da doutrina, que considera o aspecto jurídico, como fundamental para conceituação de serviços, para fins de tributação pelo ISS, apesar da materialidade trazida pelo Texto Constitucional ser bastante claro: imposto sobre serviços e, para Houaiss, serviço é produto da atividade humana destinado à satisfação de necessidades, mas que não apresenta o aspecto de um bem material (p.ex.: transporte, educação, atividades de profissionais liberais etc.). Portanto, tem-se claramente o aspecto econômico representado.
Entretanto, para Melo (2005, p. 36-37): "o cerne da materialidade da hipótese de incidência do imposto em comento não se circunscreve a "serviço", mas a uma "prestação de serviço", compreendendo um negócio (jurídico) pertinente a uma obrigação de "fazer", de conformidade com os postulados e diretrizes do direito privado." E, mais adiante, após análise do ensinamento de Maria Elena Diniz, Clóvis Beviláqua e Washington de Barros Monteiro, complementa: "não se pode considerar a incidência tributária restrita à figura de "serviço", como uma atividade realizada; mas, certamente, sobre a "prestação do serviço", porque esta é que tem a virtude de abranger os elementos imprescindíveis à sua configuração, ou seja, o prestador e o tomador, mediante a instauração de relação jurídica de direito privado, que irradia os naturais efeitos tributários."
Está, aí, uma dúvida que vinha sendo foco de discussões doutrinárias, apesar do ISS(5), conforme definido na Reforma Tributária de 1965, ter se configurando entre os tributos que incidiam sobre a produção e circulação de bens imateriais incorpóreos, como ensina o Professor Luiz Marcos Rosa do Nascimento (2003 p. 402).
Assim, seria o ISS um imposto que teria uma materialidade econômica, isto é, incidiria sobre a atividade "serviços" ou sobre a relação jurídica, "obrigação de fazer"? Esta dúvida, em termos de Direito Posto, foi finalizada, com o julgamento, pelo STF, do RE nº 116.121/SP, em que, por maioria, decidiu pela inconstitucionalidade da expressão "locação de bens móveis", constante do item 70 da Lista de Serviços, posto que esta atividade seria configurada como obrigação de dar e não de fazer.
O julgamento não fora para saber se a materialidade do imposto tinha conotação econômica ou jurídica. No entanto, como obrigação de dar revela uma relação jurídica, os defensores desta concepção, como que pegando um gancho naquela expressão, encontraram o que precisavam para finalmente estabelecer a materialidade jurídica e não econômica para o ISS, como também defende Dácomo (2006).
O que há de ser ressalvado, entretanto, é que, apesar da concepção jurídica para os serviços, o conteúdo econômico desta relação jurídica há de se fazer presente, obrigatoriamente, posto que, não estando, como nos casos de serviços prestados por entidades de assistência social, por exemplo, não haveria como ser determinado um dos aspectos mais importantes da regra-matriz, que corresponde ao quantitativo, haja vista não poder ser identificada a base de cálculo do imposto, aspecto que, no magistério de Carvalho (2005), juntamente com o aspecto "hipótese", determina a natureza jurídica do tributo.
3. ISS, receita primordial para o Município
De acordo com nossa Carta Fundamental de 1988, diferentemente das Constituições anteriores, os Municípios são parte integrante da estrutura da nossa República, conforme se pode constatar na leitura, por exemplo, do art. 1º, reforçado no disposto no art. 18, verbis:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal (...).
Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.
É como ensina Braz (2006, p. 79): "A União é formada por Estados autônomos e os Estados são constituídos por Municípios autônomos. Assim, é o Estado uma federação de Municípios, a União uma federação de Estados e o conjunto indissolúvel constitui a República, isto porque federação latu sensu é a união de vários órgãos ou organizações similares."
Esta característica de autonomia, também é destacada por Silva (2006, p. 640): "A autonomia municipal é assegurada pelos art. 18 e 29, e garantida contra os Estados no art. 34, VII, c, da Constituição."
Entretanto, pode-se considerar que esta autonomia não veio tão barato. Como se vê, ao longo de toda a CF/88, coube aos Municípios uma gama de responsabilidades como:
a) manutenção financeira do poder legislativo municipal (arts. 29 e 29-A);
b) quando houver, a manutenção financeira dos tribunais de contas municipais (arts. 29 e 29-A);
c) os serviços públicos de interesse local (6)(art. 30, V);
d) educação infantil e ensino fundamental (art. 30, VI);
e) saúde à população (art. 30, VII);
f) ordenamento do seu território (art. 30, VIII);
g) proteção do patrimônio histórico-cultural (art. 30, IX);
h) manutenção da máquina pública municipal em geral (art. 39);
i) políticas de desenvolvimento urbano (art. 182);
j) entre outras responsabilidades inerentes ao Poder Público como um todo, juntamente com a União e os Estados, como a preservação do meio ambiente.
Portanto, com fins de atender a todas estas demandas, cabe aos Municípios a busca pelos recursos necessários, dentre eles, os provenientes dos tributos, conforme se pode verificar, na leitura da CF/88, nos arts. 30, III, e 145, que estabelecem a competência dos Municípios para instituir os tributos de sua competência, e nos arts. 149-A e 156, os quais prevêem quais contribuições e impostos poderão ser instituídos e cobrados pelos Entes Municipais.
Como se pode perceber, os Municípios têm autonomia para implementar a cobrança de seus tributos, dentre eles, o ISS que, conforme visto acima, tem apresentado constante evolução em termos de importância no cenário nacional.
Em verdade, o ISS foi integrado ao ordenamento jurídico brasileiro, por meio da Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, que assim, dispunha:
Art. 15. Compete aos Municípios o imposto sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos na competência tributária da União e dos Estados.
Parágrafo único. Lei complementar estabelecerá critérios para distinguir as atividades a que se refere este artigo das previstas no art. 12 (7).
Foi mantido, nas Cartas de 1967 (art. 25, II), de 1969, com o advento da Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969 (Art. 24, II) e de 1988 (art. 156, III), com a diferença que, nesta última, a União já não tem mais a competência para tributar os serviços de transporte e de comunicações, transferidos para a competência dos Estados, a partir de 1988, conforme definido no art. 155, II.
Entretanto, por razões várias, principalmente por falta de estrutura, a maioria esmagadora de nossos Municípios não se utiliza desta fonte legítima de recursos, para a implementação de suas atribuições. Infelizmente, as transferências constitucionais, de parte dos tributos da União e dos Estados, ainda são a principal fonte de recursos, deixando estes Entes Federados como reféns dos Poderes Centrais da União e dos Estados-membros.
No entanto, para alguns Municípios (8), a receita tributária própria, provinda da arrecadação dos tributos de sua competência, tem participação mais que relevante, no conjunto das receitas públicas municipais e, em análise do estudo da carga tributária no Brasil, em 2006, a arrecadação do ISS correspondeu a 44,12% do total da arrecadação tributária dos municípios, que foi de R$ 34 bilhões, demonstrando a relevância do ISS, no contexto da receita pública municipal.
Desta forma, resta demonstrada a importância deste imposto e a conseqüente necessidade da definição correta da sua regra-matriz de incidência, em todos os seus aspectos, isto é:
a) material - prestação de serviços de qualquer natureza, não compreendidos na competência dos Estados, e definidos em lei complementar (art. 156, III, da CF/88);
b) espacial - a depender do caso:
b.1) no Município onde está localizado o estabelecimento prestador ou, em sua falta, no local do domicílio do prestador (regra geral - art. 3º, caput, da LC-116/03);
b.2) onde o serviço é executado (exceções previstas nos incisos I a XXII, do art. 3º da LC-116/03);
b.3) no Município onde:
b.3.1) as ferrovias, rodovias, postes, cabos, dutos e condutos de qualquer natureza serão objetos de locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem ou permissão de uso, compartilhado ou não (art. 3º, § 1º, da LC-116/03);
b.3.2) haja extensão de rodovia explorada, mediante cobrança de preço ou pedágio aos usuários, em que envolva a execução de serviços de conservação, manutenção, melhoramentos para adequação da capacidade e segurança de trânsito, operação, monitoração, assistência aos usuários e outros serviços definidos em contratos, atos de concessão ou de permissão ou em normas oficiais (art. 3º, § 2º, da LC-116/03);
b.3.3) está localizado o estabelecimento prestador, nos casos de quaisquer serviços prestados em águas marítimas, à exceção dos serviços portuários, ferroportuários, utilização de porto, movimentação de passageiros, reboque de embarcações, rebocador escoteiro, atracação, desatracação, serviços de praticagem, capatazia, armazenagem de qualquer natureza, serviços acessórios, movimentação de mercadorias, serviços de apoio marítimo, de movimentação ao largo, serviços de armadores, estiva, conferência, logística e congêneres, que serão devidos no município onde serão executados (art. 3º, § 3º, da LC-116/03);
b.3.4) está estabelecido o tomador ou intermediário dos serviços provenientes do exterior do País, ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País (arts 3º, I e 5º, § 2º, I, da LC-116/03);
c) temporal - quando da efetiva realização ou disponibilização do serviço ao cliente;
d) pessoal:
d.1) sujeito ativo - após definição do aspecto espacial, estabelecimento do Município competente para lançamento e cobrança do tributo;
d.2) sujeito passivo - o prestador do serviço ou, dependendo da legislação tributária do sujeito passivo, o responsável substituto
e) quantitativo:
e.1) Base de cálculo - o valor do serviço, deduzido:
e.1.1) do valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços de reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres, Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos (art. 7º, § 2º, I, da LC-116/03);
e.1.2) de outros valores admitidos pelas leis de cada Município, como no caso da Cidade do Jaboatão dos Guararapes, que permite a dedução dos valores relativos às subempreitadas, desde que já tributadas, conforme determinado no Código Tributário Municipal do Município de Jaboatão dos Guararapes, de acordo com o art. 39, § 6º, da Lei Municipal nº 155, de 27 de dezembro de 1991;
e.2) Alíquota - 5%, ou percentual inferior, a depender da legislação do sujeito ativo, como do Código Tributário do Município do Recife, em que a alíquota para os serviços de assistência à saúde, inseridos no item 4 da Lista de Serviços, quando forem prestados a pacientes do SUS, de acordo com o art. 116, II, da Lei Municipal nº 15.563, de 27 de dezembro de 1991;
Conforme se pode notar claramente, os critérios da regra-matriz têm relação uns com os outros. Entretanto, para o ISS, esta relação toma importância ímpar, em face do imposto ser de competência municipal, isto é, cada um dos municípios brasileiros, mais o Distrito Federal, são autônomos, dentro dos limites e autorizações da Constituição e dos princípios gerais do direito tributário, para legislar sobre o tributo.
Portanto, não é de se estranhar que todos os demais critérios da regra-matriz, sejam dependentes da definição correta do critério espacial, posto que este, quando definido, norteará a definição e construção de todos os demais critérios da hipótese de incidência tributária e, por isso, pode-se entende ser como o mais importante de todos.
4. O aspecto espacial do ISS
4.1. O aspecto espacial da regra-matriz de incidência tributária
Ataliba (2006, p. 104) assim se expressa:
"Designa-se por aspecto espacial a indicação de circunstâncias de lugar, contidas explícita ou implicitamente na h.i., relevantes para configuração do fato imponível."
Mais adiante, complementa:
"Como descrição legal - condicionante de um comando legislativo - a h.i. só qualifica um fato, como hábil a determinar o nascimento de uma obrigação, quando este fato se dê (se realize, ocorra) no âmbito territorial de validade da lei, isto é, na área espacial a que se estende a competência do legislador tributário. Isto é conseqüência do princípio da territorialidade da lei, perfeitamente aplicável ao direito tributário."
Neste sentido, Carvalho (2005, p. 262) ensina a possibilidade de três hipóteses para perfeitamente identificar o critério espacial de um tributo:
1ª) hipótese cujo critério espacial faz menção a determinado local para a ocorrência do fato típico:
Para esta hipótese, dá como exemplo os tributos que incidem sobre as atividades de importação e exportação. Veja que, neste caso, não seria possível, utilizando raciocínio lógico, identificar onde o fato ocorre. A lei dever informar um local, como padrão para que o fato ocorra.
2ª) hipótese em que o critério espacial alude a áreas específicas, de tal sorte que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro delas estiver geograficamente contido:
Para esta diretriz, dá como exemplo a tributação sobre a propriedade de imóveis (IPTU e ITR). Note que o IPTU irá incidir sobre a propriedade dos imóveis que estejam no território do Município, mas contidos na sua zona urbana. Portanto, em apenas uma parte do território municipal. Ao contrário daqueles que estejam localizados na sua zona rural, que serão gravados pelo tributo federal.
3ª) hipótese de critério espacial bem genérico, onde todo e qualquer fato, que suceda sob o manto da vigência territorial da lei instituidora, estará apto a desencadear seus efeitos peculiares
Para esta diretriz, Carvalho (2005) entende que caberia para os demais tributos, dentre eles, o ISS. São casos em que a identificação do local onde o fato imponível tem lugar, muitas vezes, nem é necessário ser expresso; de pronto, podemos identificá-los sem maiores problemas.
Como que para corroborar a esta última lição, temos o magistério do Moraes (1978, 485): "O imposto municipal será devido no território em cujo local de ocorrência houve a concretização da hipótese de incidência tributária, competindo a cada município atuar dentro de seu respectivo território.", pensamento que, como veremos mais adiante, entendo ter total pertinência com o teor da LC-116/03, no que diz respeito a esse assunto.
4.2. O aspecto espacial do ISS: aspectos formais da legislação
Este critério foi inicialmente tratado pelo Ato Complementar nº 36, de 13 de março de 1967, que determinava em seu art. 6º:
Art. 6º No caso de empresas que realizem prestação de serviços em mais de um Município, considera-se local da operação para efeitos da ocorrência do fato gerador do impôsto municipal correspondente:
I - O local onde se efetuar a prestação do serviço.
a) no caso da construção civil;
b) quando o serviço fôr prestado, em caráter permanente por estabelecimentos, sócios ou empregados da emprêsa, sediados ou residentes no Município;
II - O local da sede da emprêsa, nos demais casos (sic).
Vê-se que o foco da referida legislação era determinar o Município onde era executado o serviço, nos casos de construção civil, e onde estaria localizado, de forma permanente, o estabelecimento prestador, restando como exceção à regra geral, o local da sede da empresa prestadora, nos demais casos.
Com o advento do DL-406/68, posteriormente complementado por meio da Lei Complementar nº 100, de 22 de dezembro de 1999, que acrescentou a alínea "c", ao artigo 12, a orientação legal, em tese, foi radicalmente alterada, conforme se pode constatar a seguir, com a transcrição do referido dispositivo:
Art. 12. Considera-se local da prestação do serviço:
a) o do estabelecimento prestador ou, na falta de estabelecimento, o do domicílio do prestador;
b) no caso de construção civil o local onde se efetuar a prestação;
c) no caso do serviço a que se refere o item 101 da Lista Anexa, o Município em cujo território haja parcela da estrada explorada.
Assim, a orientação ou a regra geral passou a ser o local do estabelecimento prestador, com exceções para os serviços de construção civil e de exploração de rodovias, mediante a cobrança de preços aos usuários, que seriam devidos nos territórios dos Municípios onde as atividades eram efetivamente desempenhadas.
É uma diferença sutil, mas o que parte da doutrina entende, é que a vontade do legislador seria de que, com exceção das atividades de construção civil e de exploração econômica de rodovias, o imposto era devido onde estaria localizada a SEDE do prestador, mesmo que o serviço fosse prestado em outro Município, e lendo com mais cuidado o texto legal, não era o que estava escrito.
Ora, na alínea "a" do art. 12, vê-se claramente que o legislador teve o cuidado de separar estabelecimento prestador, de domicílio ou estabelecimento DO prestador.
No primeiro, temos o seguinte magistério de Barreto (2005, p. 315): é cediço e incontroverso que estabelecimento é unidade econômica. Enquanto a empresa é a atividade organizadora, produtora de bens ou da prestação de serviços, o estabelecimento é o promotor das ações ou movimentos da empresa. Estabelecimento não é a empresa: é seu órgão, o promotor das suas ações ou movimentos. Mais adiante, conclui: Estabelecimento prestador é, pois, o local em que a atividade (facere) é efetivamente exercida, executada, culminando com a consumação dos serviços.
Já, no caso do segundo, quando se fala em domicílio, entendo que devemos buscar socorro no art. 75 do CC:
Art. 75. Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é:
(...)
IV - das demais pessoas jurídicas, o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos.
Entretanto, para o Direito Tributário, devemos verificar o conjunto entre o que determinava o DL-406/68, agora determina o art. 3º da LC-116/03, e o que dispõe o CTN, em seu art. 127, II:
Art. 127. Na falta de eleição, pelo contribuinte ou responsável, de domicílio tributário, na forma da legislação aplicável, considera-se como tal:
(...)
II - quanto às pessoas jurídicas de direito privado ou ás firmas individuais, o lugar da sua sede, ou, em relação aos atos que derem origem á obrigação, o de cada estabelecimento. (grifei)
E, desta forma, este é o entendimento do Poder Judiciário, em especial do STJ, que de forma reiterada, vem decidindo em favor do Município onde o serviço é executado, independente da atividade exercida.
A orientação legal, trazida pelo DL-406/68, de certa forma é confirmada com o advento da LC-116/03, conforme se pode perceber na leitura do art. 3º, in verbis:
Art. 3º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local.
Em princípio, pode-se cogitar em haver diferenças significativas, entre o DL-406/68 e a LC-116/03, isto é, que nesta última, o rol de serviços, cuja incidência do tributo se dará no local onde o serviço é prestado, é bem superior, conforme já demonstrado, inclusive, na definição da regra-matriz do imposto, no item 3 acima.
Entretanto, a lei de 2003, ao que se percebe, retoma o conceito do Ato Complementar nº 36/67 e do próprio DL-406/68, ou seja, como regra geral, o local do estabelecimento prestador, sendo este localizado no Município onde o serviço é executado, conforme dispõe de forma muito clara, o art. 4º da LC-116/03, verbis, com a diferença de que, agora, torna-se irrelevante, ter ou não, o estabelecimento o caráter permanente:
Art. 4º Considera-se estabelecimento prestador o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas.
Alguns poderão questionar: cabe ao Direito Tributário dispor sobre este assunto, ou seja, definição de estabelecimento prestador? Não seria esta, uma matéria do Direito Privado? A resposta seria sim, caso o dispositivo acima estivesse conceituando ou definindo estabelecimento prestador. Entretanto, ao se analisar com o devido cuidado, pode-se entender que o legislador não apresentou uma definição de estabelecimento. Em verdade, fez menção que, para efeitos do imposto, estabelecimento prestador, independente de ser nomeado como sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato, e aqui, vê-se que se encontra implicitamente, a expressão nos termos da legislação pertinente, é onde será desenvolvida a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário.
Mais adiante, estudar-se-á, com detalhes o conteúdo do artigo 4º da LC-116/03, na tentativa de estabelecer o conteúdo prático deste dispositivo, em face da definição correta do critério espacial do imposto.
4.3. O princípio da territorialidade da lei
Este princípio, conforme ensina Ataliba (2006, p. 104-105): "Pois as conotações espaciais da hipótese de incidência são decisivas para a conformação do fato imponível. Essa perspectiva genérica do aspecto espacial da h.i. está presa ao (dependendo) âmbito de competência do legislador ordinário: a lei municipal só tem eficácia no território do Município; a lei estadual só no próprio estado. Só a lei federal tem abrangência nacional."
Entretanto, destaca Martins (2004, p. 110): "A lei tributária tem vigência no território do Município, que é detentor da competência constitucional para exigir o ISS."
Portanto, vê-se que o aspecto espacial novamente se apresenta relevante, interferindo na aplicação, também, do princípio da territorialidade da lei tributária, visto que, caso o critério espacial tenha se verificado no Município "A", a lei do Município "B", onde o prestador do serviço está sediado, não terá eficácia, para fins de lançamento e cobrança do ISS, porventura incidente na operação.
Em outras palavras, se o aspecto espacial da hipótese de incidência tributária tenha ocorrido em município diverso ao do prestador, como no caso de um prestador de serviços sediado no Município "A", que realize a hipótese de incidência no Município "B", este terá plenas condições de impor sua legislação sobre a empresa prestadora, mesmo que esta esteja sediada em outro Município.
4.4. O aspecto espacial do ISS: visão doutrinária
Baptista (2005, p. 517), consubstanciado no ensinamento de Geraldo Ataliba, Aires Fernandino Barreto, Heron Arzua, Betina Treiger Grupenmacher, Marçal Justen Filho e Paulo de Barros Carvalho, ensina que: "Realizada uma prestação de serviço no local A, jamais será lícito ao legislador afirmar que, para fins tributários, aquele mesmo fato, já marcado no tempo e no espaço, foi realizado no local B. O efeito dessa imputação seria o de incompatibilizar a materialidade da hipótese de normativa com as suas coordenadas espaciais. Existe uma sintonia cerrada entre os critérios da hipótese. Se ela descreve abstratamente um fato do "mundo real", ainda que também jurídico, ela não pode alterar aquilo que o define como tal, sob pena de estar fazendo referência a fato diverso."
A seguir, arremata o mestre: "Portanto, quanto à localização no espaço, tem-se que o local da prestação do serviço é aquele em que o prestador cumpre com o dever jurídico (prestação-fim), na forma do contrato celebrado com o tomador."
Como maior defensor desta tese, até pelo fato do STJ ter adotado expressamente seu ensinamento, destaca-se Carraza (1989, p. 210): "Se o serviço é prestado no Município 'A', nele é que deve ser tributado pelo ISS, ainda que o estabelecimento prestador esteja sediado no Município 'B'. Do contrário estaríamos admitindo que a lei do Município 'B' pode ser dotada de extraterritorialidade, de modo a irradiar efeitos sobre o fato ocorrido no Município onde ela não pode ter voga. Sempre o ISS é devido no Município em cujo território a prestação de serviço se deu. Isso a despeito do que dispõe o art. 12 do Decreto-lei nº 406/68, que não se sobrepõe a nenhuma norma constitucional."
Com esse fundamento, o Professor entende que o disposto no art. 12, "a", que determinava o Município onde estaria o estabelecimento prestador, não teria sido recepcionado pela CF/88, a qual, segundo sua ótica, determina o local onde se realizaria o fato jurídico imponível, gerador da obrigação tributária, como aquele onde todo e qualquer serviço é efetivamente executado, sendo, assim, um dispositivo inconstitucional.
Esta lição, mesmo com o advento da LC-116/03, consta como atualizadíssima, face o que a doutrina considera como repetição do conteúdo do DL-406/68, na regra geral de identificação do aspecto espacial, salvo as exceções expressamente relacionadas nos incisos I a XXII do art. 3º.
Melo (2005, p. 167 e 171) tem o entendimento pela prevalência do texto legal, em detrimento da defendida definição do aspecto material, contida na Constituição, conforme se pode verificar abaixo:
"Ainda que se aceite o princípio da lex loci actus - com assento constitucional - em oposição ao postulado da Lex domicilii - fruto da ficção jurídica - não se pode ignorar a realidade do mundo circundante, ou seja, diversificadas situações como a ausência (ou a existência) de um ou mais estabelecimentos, e a participação de duas (ou mais) unidades empresariais localizadas em municípios diversos."
Mais adiante, tece o seguinte comentário, acerca da posição dominante do STJ:
"A jurisprudência firmada no STJ incorre em antinomia constitucional, porque, se de um lado prestigia o princípio da territorialidade da tributação, harmonizando o princípio da autonomia municipal (competência para exigibilidade de seus próprios impostos); de outro, ofende o princípio da legalidade, uma vez que se choca com a clareza do Preceito do Dec.-lei nº 406/68, face que competirá ao STF solucionar o impasse afeto à constitucionalidade do preceito."
O Professor Moura (2004, p. 165/166), tendo raciocínio semelhante, tece os seguintes comentários: "Em que pese o respeito quanto aos fundamentos do posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, ao prestigiar o princípio da territorialidade em sentido real de forma a limitar o âmbito de incidência da norma aos limites territoriais do município, não cremos que tenha sido atribuída à controvérsia a melhor interpretação. Haveria necessidade de observância aos termos da alínea "a" do artigo 12 do Decreto-Lei 406/68, veículo introdutor de norma geral de direito tributário, com a conseqüente fixação de critério para o exercício da competência tributária dos municípios quanto à tributação da prestação de serviços, de modo a adotar o estabelecimento prestador como elemento de conexão pessoal."
Na esteira dos Professores José Eduardo Soares de Melo e Fábio Clasen de Moura, embora com uma radicalidade um pouco exacerbada, em relação ao entendimento do STJ, Martins (2004, p. 114) tem a seguinte idéia:
"O art. 12 do Decreto-lei nº 406/68 ou o art. 3º da Lei Complementar nº 116/03 não contrariam a Constituição. A Lei Magna apenas determina que a lei complementar defina os serviços submetidos ao ISS (art. 156, III), além de dispor sobre conflitos de competência entre pessoas jurídicas tributantes (art. 146, I). A regra constante do art. 3º da Lei Complementar nº 116/03 constitui exceção ao princípio da territorialidade, não sendo compatível com a constituição."
E, invocando o ensinamentos de Edivaldo Brito, para o qual "importa saber onde está o estabelecimento prestador dos serviços, pois onde ele existir, aí paga o ISS" e de Bernardo Ribeiro de Morais, que afirmara ser o ISS "devido no município onde está localizado o estabelecimento prestador e não onde o serviço é executado", conclui seu raciocínio com a seguinte hipótese: "Se a empresa é sediada no Rio de Janeiro, por exemplo, prestando serviços em Marília, onde não possui nenhum estabelecimento prestador, o ISS é devido no Rio de Janeiro, pois é nesta cidade que está o estabelecimento prestador."
Com o devido respeito, é uma idéia que não terá muitos seguidores junto à doutrina, muito menos na Jurisprudência, principalmente em face do que será demonstrado no item 6, adiante.
4.5. O aspecto espacial do ISS: a Jurisprudência dominante
O STJ vem decidindo, de forma reiterada, que o ISS é devido onde ocorreu a execução do serviço, com o fundamento de que o DL-406/68, ao afirmar que o serviço é devido no local do estabelecimento prestador, em verdade pretende que o imposto seja devido ao Município onde o serviço foi prestado, invocando, também, o princípio da territorialidade, afirmando a competência municipal de tributar as atividades praticadas em seu território, além de sugerir que a autonomia municipal poderia ser quebrada, mediante a possibilidade de outro Município alcançar, com sua lei, seu território.
Como se viu, este entendimento não encontra respaldo unânime na doutrina. Uma parte entende ser perfeita; outra, ser uma atitude inconstitucional do STJ, que não estaria obedecendo à determinação legal. Esse fato tem a capacidade de gerar um grande número de conflitos, entre os principais personagens (contribuinte e Fisco), motivo de constantes e perenes discussões, em níveis administrativo e judicial.
4.6. O aspecto espacial do ISS: visão sistemática da legislação em vigor
Em que pese todas as posições aqui relatadas, pode-se entender que a definição do aspecto espacial do ISS, não apresenta (ou não deveria apresentar) maiores problemas. Em verdade, mesmo que de forma implícita, o critério espacial está perfeitamente delineado na Matriz Constitucional do ISS, desde o surgimento do tributo, no ordenamento jurídico brasileiro, com a Emenda Constitucional nº 18, de 1965, isto é, o local onde o serviço é executado.
Entretanto, como chegar a esta conclusão, sem ferir preceitos Constitucionais, as normas gerais da lei complementar e os princípios gerais de direito tributário? Para isso, precisa-se voltar à análise dos textos do art. 12 do DL-406/68 e do art. 3º da LC-116/03:
DL-406/68:
Art. 12 Considera-se local da prestação do serviço:
a) o do estabelecimento prestador ou, na falta de estabelecimento, o do domicílio do prestador;
b) no caso de construção civil o local onde se efetuar a prestação;
c) no caso do serviço a que se refere o item 101 da Lista Anexa, o Município em cujo território haja parcela da estrada explorada (sic).
LC-116/03:
Art. 3º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas no incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:
Ao que parece, não restam dúvidas que as duas normas complementares acompanham a determinação constitucional, de definir o local onde está localizado o estabelecimento prestador, ou seja, onde é realizada a atividade de prestar o serviço, como competente para cobrar a obrigação tributária.
6. Conclusões
No dispositivo de 1968, pode-se ter algumas dúvidas. Por meio de uma leitura mais aprofundada, o texto não se apresenta completo, isto é, integrante de maiores critérios que façam com que o intérprete jurídico obtenha a significação correta, em relação ao aspecto espacial do tributo.
Entretanto, a partir de 2003, a definição, para fins tributários, do que corresponde a estabelecimento prestador, por meio do disposto no art. 4º, da LC-116/03, desfazem-se as possíveis dúvidas a respeito da definição do aspecto espacial do ISS, dando condições a serem estabelecidos os demais critérios da regra-matriz do ISS:
Art. 4º Considera-se estabelecimento prestador o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas.
Para esclarecer melhor esta tese, vejamos a afirmativa abaixo, construída a partir da sobreposição do conteúdo material dos arts. 3º e 4º da lei de 2003:
Ressalvadas as hipóteses previstas nos incisos I a XXII, do artigo 3º da LC-116/03, em que não haveria dúvidas quanto à identificação do local onde está sendo executada a prestação dos respectivos serviços, para as demais atividades constantes da Lista de Serviços, o serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador, que corresponde ao local onde o contribuinte desenvolve a atividade de prestar serviços, de forma permanente ou temporária, configurando-se, dessa forma, como uma unidade econômica ou profissional, ou seja, onde o prestador dos serviços tenha disponibilizado seus bens e/ou profissionais, para a execução dos serviços(9)(10), sendo irrelevantes, para caracterizá-lo como estabelecimento prestador, as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras denominações que venham a ser utilizadas, ressalvado que, na impossibilidade da determinação do local onde está localizado o estabelecimento prestador, e como meio de dirimir possíveis conflitos de competência, entre os Municípios interessados, será considerado competente para a cobrança do imposto, o Município onde o prestador do serviço esteja domiciliado, nos termos da lei civil.
Portanto, a partir da leitura da afirmativa acima, fica bastante transparente que o imposto sobre serviços de qualquer natureza é devido no local onde o serviço é prestado, em todas as hipóteses elencadas na Lista de Serviços, observado que:
a) nas hipóteses constantes dos incisos I a XXII, do art. 3º da LC-116/03, como exceção à regra geral, será no local onde o produto do serviço prestado estará perfeitamente identificado, pois são atividades que podem ser desenvolvidas em locais diferentes de onde está o estabelecimento prestador, como nos casos das atividades de execução de obras de construção civil, subitem 7.02 e limpeza e dragagem de rios, subitem 7.18, já que o canteiro de obras poderá ser localizado em outro município; e
b) na maioria das hipóteses, como o legislador complementar entendera que a definição do aspecto espacial não seria de todo facilitada, a própria LC-116/03, estabelece alguns critérios para a definição do local onde o serviço é prestado, isto é, onde está localizado o estabelecimento prestador do serviços, ou seja, como determina a própria lei, o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, como nos casos dos serviços de medicina, subitem 4.01, de manutenção e conservação de máquinas, subitem 14.01 e serviços de distribuição e venda de bilhetes, subitem 19.01.
O que tem de ser observado neste caso, é que o critério escolhido pela lei, isto é, a localidade onde está o estabelecimento prestador, que necessariamente não precisa ser a sede ou a filial da empresa, tem total pertinência com a matriz do imposto na Constituição.
Em verdade, uma empresa de manutenção de equipamentos pode ter sua sede no Município de São Paulo, ser contratada por um cliente sediado no Município de Recife e instalar seu estabelecimento prestador, composto de seus equipamentos e pessoal especializado, necessários para a execução da atividade, no Município de Caruaru, onde o serviço será executado e, neste último, será devido o ISS;
c) e, finalmente, caso não seja possível estabelecer em qual município está localizado o estabelecimento prestador, ou onde o serviço é executado, e como meio de dirimir conflitos de competência, conforme previsão do art. 146, I, da Constituição, é competente para a cobrança do ISS, o Município onde está o domicílio do prestador. Assim, é que foi decidido pela LC-116/03, obedecendo ao que determina a Lei Maior.
Ao que se pôde constatar, muito tem se falado, escrito e decidido, a respeito da definição do aspecto espacial do ISS, sem a leitura correta do texto constitucional e da lei complementar pertinente, de acordo com o exposto acima.
O aspecto espacial, sempre esteve presente no ordenamento jurídico brasileiro, seja no texto do Ato Complementar nº 36, de 1967, seja nos textos constitucionais, desde a Carta de 1967, seja no texto do DL-406/68 e, agora, com maior clareza, no texto na LC-116/03, ou seja, o local onde o serviço é prestado ou posto à disposição do tomador.
Aliado a isso, outro fato se torna latente: a LC-116/03, além de dispor de normas gerais do ISS e definição do elenco das atividades constantes do critério material do imposto, apresenta-se como titular do poder de dirimir conflitos de competência, entre Entes Municipais, nos termos do art. 146, I, da Constituição Federal de 1988.
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Notas
(1) Hoje, tem-se muitos exemplos de empresas que transferem a fabricação de seus produtosa outras empresas, como nos casos de computadores, calçados, eletrodomésticos, etc.
(2) http://pt.wikipedia.org/wiki/Munic%C3%ADpios_do_Brasil
(3) Neste caso, o serviço é representado por uma riqueza agregada ao bem entregue (uma veículo reformado, por exemplo), visto que, sobre a circulação do bem em si, incidiria o ICMS.
(4) Há de se tomar muito cuidado com este termo, visto que existem casos de bens imateriais ou incorpóreos, com a incidência do ICMS, como no caso do software de prateleira.
(5) Tributo que substituiu o antigo imposto municipal de indústrias e profissões e imposto sobre diversões públicas.
(6) Tais como limpeza, iluminação pública e transporte coletivo.
(7) O art. 12 estabelecia a competência dos Estados para a instituição do imposto sobre as operações relativas à circulação de mercadorias, realizadas por comerciantes, industriais e produtores.
(8) Infelizmente, uma pequeníssima minoria.
(9) Com relação a unidade econômica ou profissional, Martis (2004, p. 113) afirma que estabelecimento prestador pode desenvolver suas atividades num local de forma permanente ou temporária. Entretanto, é necessário que configure unidade econômica (empresa) ou profissional (profissionais liberais ou autônomos). Se o estabelecimento não configura unidade econômica ou profissional, independentemente da denominação utilizada pelo contribuinte, não será estabelecimento prestador. Assim, se num local há apenas mesa e telefone, sem que se constitua em unidade econômica ou profissional, este não será estabelecimento prestador.
(10) Também, neste sentido, Ferreira (2006, p. 96) destaca que, no Município de São Paulo, para que um estabelecimento prestador de serviço seja considerado como unidade econômica ou profissional é indicada a conjugação, parcial ou total, dos seguintes elementos:
1- manutenção de pessoal, material, máquinas, instrumentos e equipamentos próprios ou de terceiros necessários à execução dos serviços;
2- estrutura organizacional ou administrativa;
3- inscrição nos órgãos previdenciários;
4- indicação como domicílio fiscal para efeito de outros tributos;
5- permanência ou ânimo de permanecer no local, para a exploração econômica de atividade de prestação de serviços.
Abreviaturas e Siglas
CC - Código Civil Brasileiro - Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
CF/88 - Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CTN - Lei Federal nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional
DL-406/68 - Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICM - Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias, realizadas por produtores, industriais e comerciantes.
ICMS - Imposto sobre as operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação
IPI - Imposto sobre produtos industrializados
IPTU - Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana
ISS - Imposto sobre serviços de qualquer natureza
ITR - Imposto sobre a propriedade territorial rural
LC-116/03 - Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003
PIB - Produto Interno Bruto
RFB - Receita Federal do Brasil
STF - Supremo Tribunal Federal
STJ - Superior Tribunal de Justiça
SUS - Sistema Único de Saúde
Este Trabalho
O Presente estudo é baseado em minha monografia, elaborada como trabalho de conclusão do Curso de Especialização em Direito Tributário, promovido pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET, concluído em dezembro de 2008.
Fonte Fiscosoft
Geovane Basilio da Silva
Auditor Tributário do Município do Jaboatão dos Guararapes/PE, atualmente na função de Julgador Tributário da Primeira Instância Administrativa. Pós-Graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET. Pós-Graduado em Contabilidade e Controladoria de Entidades da Administração Pública -UFPE. Graduado em Ciências Contábeis - UFPE
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